domingo, abril 30, 2006

DO SILVA E DOS POBRES


O Silva, afinal, regressou. Esteve com as tropas portuguesas, fez o discurso do 25 de Abril e esteve ontem na ovibeja, afinal não há amor como o primeiro. O problema foi mesmo o discurso da evocação (este ano foi evocação) do 25 de Abril. Não é que o Silva começou a falar de exclusão social? Ter-lhe-á dado alguma coisa? A direita, pavlovianamente aplaudiu; a esquerda também pavloviana não aplaudiu. Quem não gostou nada e ficou perplexo com tudo isto foi o Fernandes, o Zé Manel, director do Público. Nem a Helena Matos. A Matos, no Público de ontem, contornou o assunto com os carenciados, mas nota-se o incómodo no último paragrafo: "levamos todo o século XX a falar de pobres. (...). Talvez seja mais do que o momento de falarmos menos de pobreza e mais de como produzirmos riqueza". Pois. Hoje, no mesmo Público, uma tal Isabel Jonet, com ar de quem tem passado fome de caviar, do Banco Alimentar contra a Fome, afirma que "só o desenvolvimento económico pode ajudar a combater a pobreza". A ajudar isto tudo (há coisas que convém não passar impunes, não é ao Zé Manel?) temos uma tese de doutoramento (para alguma coisa servem afinal as teses universitárias) que conclui que o "Rendimento Mínimo não vence imobilismo social dos beneficiários". Será que este doutor já experimentou viver com 30 contos mensais?
O discurso de Silva foi demasiado inevitável e surpreendente ao mesmo tempo. Portugal é um dos países mais pobres da União Europeia, mas é sobretudo um dos países com mais pobres da União Europeia: 20 por cento da população. E nada disto mudou nas últimas décadas. Que esta situação salazarenta continue passados 32 anos depois do 25 de Abril sem que ninguém faça nada é escandaloso e revela que o fundamental do 25 de Abril está por cumprir. É que à esquerda os pobres - que são também pobres de espírito - não dão votos, e a direita, e também certa esquerda, querem conserva-los como espécie protegida. Atracção turistica.