segunda-feira, janeiro 31, 2011

Catarina Nunes de Almeida


Três moças cantavam d'amor
os braços debulhados dispostos no lençol.

A casa era um corpo
invertebrado.
Um bicho sem concha
à sombra das coxas mas moças
que d'amor cantavam

e sobrevoavam o linho
de pernas para o mar
uma de dentro da outra para dentro da outra

e trocavam de sapatos
e teciam véus e vulvas
como quem ensaia a perfeição de um delito.

***

Vamos, irmã, vamos folgar
nas margens do lago u eu vi andar
a las aves meu amigo.

Vamos carregadas de braços
lavrar as aves tardar nas aves
do meu amigo.

Vamos, irmã, vamos folgar
pingar com as aves
nós duas estreitas
para o amigo.

Vamos carregadas de noites
acender as aves pousar as aves
boca a boca
no amigo.

Catarina Nunes de Almeida, Bailias, Deriva, Porto, 2010, pp. 14 e 15.

Catarina Nunes de Almeida nasceu em Lisboa em 1982. Licenciada em Língua e Cultura Portuguesa pela FLUL, foi docente na Universidade de Pisa (Itália).Como poeta estreou-se com o livro Perfloração (Quasi, 2006) que obteve o Prémio de Poesia Daniel Faria e o Prémio do PEN Clube Português para a Primeira Obra. Em 2008 publicou A metarmofose das Plantas dos Pés (Deriva) e, no ano passado, Bailias (Deriva) que faz uma revisitação dos Cancioneiros medievais.

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