GRANDE ÉCRAN
No grande écran
a festa do homem lobo do homem
e a sua mulher de bicicleta
até que um século de furor
abra a cratera donde irrompe o rosto do poeta
as suas mãos borboletas gigantes
os seus pés peixes voadores
a sua boca asa de fogo branco
e outro século
erga a pirâmide de palavras
que se derramem docemente
de anel em anel
até ao último século
*
TESES SOBRE A VISITA DO PAPA (excertos)
6
Explorado sê manso e obedece. Pode ser que entres no reino dos céus, de camelo ou às costas de um rico. obedece. Pode ser que vás para a cama com a Pátria. Obedece. Pode ser que o teu cadáver ainda venha a ser o estandarte glorioso do Partido. Nunca percas a esperança, explorado, jamais.
7
Abaixo a união livre.Viva a coexistência pacífica. O casamento do capital e do trabalho vai ser o grande casamento do século. Não haverá oposição dos pais nem da polícia. Sobretudo, tudo menos a erotização do proletariado. Felicidades, explorado.
António José Forte, Corpo de Ninguém, Hiena Editora, Lisboa, 1989, pp. 69 e 100-101.
terça-feira, outubro 29, 2013
domingo, outubro 13, 2013
João Miguel Henriques
ACÁCIAS EM CHAMAS
em cores brutais
de outono imenso
tive sonhos de acácias em chamas
perpetuados por densos fogos fátuos
febris como ameixas amarelentas
em calda antiga
acácias em chamas inteiras
e para sempre
O VENTO E OS SALGUEIROS
a toupeira surge plácida
de um qualquer reguengo adormecido.
há que arrebatar o quanto antes
seis ou sete batatas doces
para dar o dia
por completo
às cinco bebe-se o chá
na toca escura, aburguesada,
do velho rato
(um amigo de paleio)
ainda sopra um vento antigo
pelas ramagens dos salgueiros.
a toupeira habita terra
e guarda as lentes graduadas
no bolso do paletó
João Miguel Henriques, O Sopro da Tartaruga, edição de autor, 2005, pp. 5 e 39.
em cores brutais
de outono imenso
tive sonhos de acácias em chamas
perpetuados por densos fogos fátuos
febris como ameixas amarelentas
em calda antiga
acácias em chamas inteiras
e para sempre
O VENTO E OS SALGUEIROS
a toupeira surge plácida
de um qualquer reguengo adormecido.
há que arrebatar o quanto antes
seis ou sete batatas doces
para dar o dia
por completo
às cinco bebe-se o chá
na toca escura, aburguesada,
do velho rato
(um amigo de paleio)
ainda sopra um vento antigo
pelas ramagens dos salgueiros.
a toupeira habita terra
e guarda as lentes graduadas
no bolso do paletó
João Miguel Henriques, O Sopro da Tartaruga, edição de autor, 2005, pp. 5 e 39.
João Miguel henriques nasceu em Cascais no ano de 1978. O Sopro da Tartaruga (2005) foi o seu primeiro livro de poemas. Em 2011 publicou na Artefacto Isso Passa. A sua poesia na senda de um realismo imperativo nas últimas décadas, faz algumas inflexões com imagens bastante criativas e inovadoras. É autor do blogue Quartos Escuros, onde podem ser lidos alguns dos seus poemas inéditos.
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