sexta-feira, dezembro 23, 2011

O QUE DIZEM JORNAIS


Ler jornais, nesta altura do campeonato, pode tornar-se num acto deprimente, algo que pode levar-nos ao psiquiatra em busca de Prozac ou mesmo à psicanalista para nos levantar a libido (vd. Um método perigoso de David Cronenberg, um filme medíocre). Se Henrique Raposo, no Expresso de hoje, se queixa que as redacções dos telejornais estão cheias de perigosos esquerdistas que deturpam as palavras do nosso querido líder, já Pedro Lomba, no Público de ontem, arremete contra o deputado socialista Pedro Nuno Santos que terá dito que “se está a marimbar para os credores”. O argumento de Lomba é moral, e parece ser esse o novo argumento da direita portuguesa: temos que pagar a dívida, nem pensar em não o fazer, senão o que somos? Caloteiros, uma nação sem moral, sem crédito (no amplo sentido da palavra). Ora Lomba, como a restante direita, esquecem-se do exemplo da Islândia. Esquece-se Lomba e esquecem-se os telejornais, que na realidade não passam de pasquins tablóides obedecendo a Relvas e Balsemão e Pais do Amaral. Mas a direita no poder e o seu séquito mediático (cujo exemplo maior é Medina Carreira, na TVI, em quem deve ter encarnado o espírito de Salazar) teimam em achar que devemos pagar a dívida aos usurários da troika – e nem pensar em renegociar. Uma dívida que tem um juro de 44 por cento.
Vasco Pulido Valente é o expoente máximo da asneira na opinião publicada em jornais portugueses. Embora por vezes pareça padecer de uma demência senil, é sobretudo um profundo ódio e ressentimento contra Portugal e os portugueses que o movem nas crónicas da última página do Público ao fim-de-semana. Ao seu lado estão Maria Filomena Mónica e António Barreto. Se detestam assim tanto Portugal, porque não emigraram, porque não ficaram pela tão amada Inglaterra ou Suíça? A resposta é simples: lá não seriam ninguém, nem as universidades desses países lhes dariam lugar. Alguém que emigrou, acabando por se tornar professor numa universidade da província em França, foi Eduardo Lourenço. Lourenço vivendo entre França e Portugal, abraçou a neurose da portugalidade, algo que consiste em escrever sobre um assunto tão inefável como o que é ser português. Lourenço que queria ser romancista, mas escreve entre o ensaio e a filosofia, ganhou o prémio Pessoa 2011, do qual foi júri durante alguns anos. Lourenço escapou à mal afamada filosofia portuguesa, mas vai dizendo estas preciosidades tão ao gosto dos jornalistas: “Há uma frase de Nietzsche que gosto de recordar porque é muito crística e que diz que ‘só’ os túmulos conhecem a ressurreição. Portugal desceu ao túmulo. A história de Portugal é muito curiosa. Aí se vê a nossa tendência milagrenta. De que Portugal assenta num milagre”.
Podia continuar, mas já vai longo o post. Com jornais destes, de referência, propriedade dos senhores Azevedo e Balsemão, o melhor é ler jornais desportivos. Talvez se encontre a afirmação, de um treinador ou futebolista, que determinada vitória assentou num milagre.

terça-feira, dezembro 20, 2011

QUERIDOS LÍDERES

(Pedro Passos Coelho)
(Kim Jung-un, 29 anos, novo líder da Correia do Norte)
(Angela Merkel, Chanceler da Alemanha desde 2005)
(Raymond W. McDaniel, CEO da Moody's)
(Stephen W. Joynt, CEO da Fitch)

(Douglas L. Peterson, CEO da Standard & Poor's)

quarta-feira, novembro 30, 2011

PAULO DA COSTA DOMINGOS


Um cordão policial, na socialização
da falência, debrua as sanefas.
Julga-se que a lógica é
salvar os ricos e esperar

que eles deixem cair,
dos seus sacos a abarrotar
de dinheiro, algum
na praça pública.

***

Coragem. Simulacro por
simulacro, qualquer um pode
ter um brinquedo destes
para sair ao domingo. Só que

com menos motor, menos ideias.
Talvez por decreto d'óbito e
acordo da cristandade e de outros
ela morra: a economia de mercado.

Paulo da Costa Domingos, Averbamento, & etc, 2011.

quarta-feira, novembro 02, 2011

AFONSO CRUZ


A visão do céu era ainda mais fantástica do que aquela que tinha tido no balão de observação durante a Primeira Guerra Mundial. As pessoas eram ainda mais pequenas e chegavam mesmo a não existir. Quanto mais se sobe, mais as pessoas desaparecem. Os governos não sabem que as pessoas existem, de tão em cima que estão. Falam do povo, mas é uma entidade abstracta, tal como nós falamos de Deus. Ninguém, lá do alto da governação, sabe se o povo realmente existe, é uma questão de fé. Chega-se até a descrever as suas características e a temê-lo, mas nunca ninguém o viu, senão uns místicos que desceram ao nosso nível e que acabaram descredibilizados e ridicularizados. O místico diz que o povo sofre e que é preciso mais justiça e que cada pessoa tem uma vida e não são uma Unidade, mas que são, isso sim, pessoas realmente separadas umas das outras, com existência própria. Ele, como um profeta do fim dos tempos, avisa os seus congéneres de que o povo pode ser perigoso e pode derrubar coisas muito altas. É preciso não esquecer, diz ele com o dedo esticado para baixo, que, por mais alta que seja uma árvore, o seu tronco mantém-se ao alcance de um machado. Mas ninguém dá ouvidos ao mistico que viajou até à terra e a sua carreira política termina imediatamente e de forma ultrajante.

Afonso Cruz, O Pintor Debaixo do Lava-Loiças, Caminho, 2011, pp.147-8

sábado, outubro 22, 2011

O PIOR POEMA DA LITERATURA PORTUGUESA


Alma minha gentil, que te partiste
Tão cedo desta vida, descontente,
Repousa lá no Céu eternamente
E viva eu cá na terra sempre triste.

Se lá no assento etéreo, onde subiste,
Memória desta vida se consente,
Não te esqueças daquele amor ardente
Que já nos olhos meus tão puro viste.

E se vires que pode merecer-te
Alguma cousa a dor que me ficou
Da mágoa, sem remédio, de perder-te,

Roga a Deus, que teus anos encurtou,
Que tão cedo de cá me leve a ver-te,
Quão cedo de meus olhos te levou.

Luís de Camões

Nota: é evidente que há muitos maus poemas, mesmo entre os poetas canónicos da literatura portuguesa, mas a cacafonia do primeiro verso associada à ideia e, sobretudo palavras (alma, minha, gentil, partiste), têm dado um forte contributo para o ódio à poesia, aprendido nas escolas por sucessivas gerações.

sábado, outubro 15, 2011

15O - INDIGNAÇÃO MUNDIAL

Lisboa
Zurique
Hong Kong
Sidney
Hong Kong
Seul, Coreia do Sul
Barcelona
Madrid
Roma

(Fotos do Diário de Notícias, The Guardian, El Pais, agências)

sábado, setembro 03, 2011

ANIQUILAR UM PAÍS



O que este governo se prepara para fazer com o anúncio de novas medidas de austeridade que vão além das medidas exigidas pela "troika" é destruir um país. Um país é feito de pessoas, o governo de Sócrates fez tudo para tornar o interior de Portugal num deserto - fecho de escolas, centros de saúde, etc. O Governo de Passos Coelho - que é bom lembrar é o responsável pela situação a que Portugal chegou ao não procurar um entendimento com Sócrates -, prepara-se agora para aniquilar este país. Pelas mãos deste ministro das finanças Portugal será incinerado, sacrificado como um cordeiro perante os deuses dos mercados e as agências de rating - afinal é para eles que este governo executa estas medidas que a prazo vão destruir a economia portuguesa. Mas a economia, na sua pulhice, é o menos. Os cortes na saúde são criminosos porque vão levar a um aumento da mortalidade.O ministro da economia sabe do que fala quando diz que serão tomadas medidas nunca tomadas antes de 1950. Ora em 1950 estavamos em pleno salazarismo. É para lá, como que viajando no tempo, que este governo quer conduzir a vida dos portugueses. E os portugueses que votaram em Passos Coelho e em Portas, o que fazem perante a aniquilação do seu modo de vida? Nada, simplesmente nada, como se tudo fosse um fatalismo, um fado. Alguns regressados de férias, e enquanto não são despedidos, vivem como se nada se passasse, como se nada fosse com eles, habituados a informar que nada é ali - é no outro guichet, na outra repartição, na outra loja, num outro país, talvez mesmo num outro planeta.

quarta-feira, agosto 31, 2011

JOÃO URBANO





Introduziu, no regresso a Lisboa, uma cassete no rádio-gravador a ver se punha no ar um som de jeito. A cassete nem ia para a frente nem para trás. Parou numa estação de serviço para reabastecer. Aquele era um lugar de passagem, um não-lugar quase desolado, apesar do brilho dos néones. Quando se fez de novo à estrada o gravador pôs-se a funcionar sem porquê e derramou tons crus de guitarra, um baixo rápido a saturar, uma batida quase desconexa e uma fina cobertura de vozes andróginas e vaporosas. Pouco depois percutia um dos temas de Closer dos Joy Division. A precipitação das batidas, um tamborilar em pequenas quedas de água, a guitarra plangente de caos e This is the way, step inside a sair das goelas ternas de Ian Curtis, tudo num estrugido demorado, em câmara lenta, o que o transportou para um estado raro de turbulência. Porra, vivia no melhor dos mundos.

João Urbano, Romance Sujo, UR, 2010, pp. 103-104

quarta-feira, agosto 10, 2011

A POLÍTICA FAZ-SE NA RUA

















Aquando das manifestações no Norte de África (Praça Tharir e outras) o Ocidente aplaudiu. Mas agora a revolta chegou a Londres e outras cidades inglesas e o PM inglês, como vários dos comentadores que apoiaram as revoltas àrabes não gostam desta revolta de "vandalos". Pode ser até que alguns sejam vandalos, mas ao ponto em que as democracias ocidentais chegaram, dominadas pela pulhice financeira, estes "Punks" (punk is not dead, pode-se dizer por estes dias) manifestam o seu nojo pelo estado em que as democracias definham. Fazer política também é isto. Ameaçar com a prisão estes "vandalos", utilizando mecanismos de vigilância dignos de um Big Brother (o de Orwell), como Cameron fez é uma atitude muito próxima de um ditador encurralado.