quarta-feira, janeiro 11, 2012

A VERDADE SOBRE A DÍVIDA



Enquanto a operação choque e pavor se desenrola por aqui (e em Espanha e Itália e Grécia, etc.), a Alemanha vive dias paradisíacos nos mercados. Na segunda-feira, pela primeira vez desde que há memória, os investidores pagaram para comprar dívida pública alemã. É estranho, não é? As pessoas que emprestam dinheiro pagam para emprestar? É esquisito, mas aconteceu: esta foi a semana em que a Alemanha passou a ganhar dinheiro quando pede emprestado. Os investidores querem tanto ficar com títulos de dívida alemães que aceitam juros negativos para que a Alemanha os deixe emprestar-lhe dinheiro. Isto é economicamente estranho? É, aliás nunca tinha acontecido. Mas é o resultado económico, fantástico para a Alemanha, da descrença total no futuro do euro e da Europa tal como ela foi organizada. A crise do euro, afinal, tem vencedores: a Alemanha ganha com a sua dívida pública, está a aguentar uma taxa de emprego razoável, importa cérebros fugidos de países miseráveis e, por enquanto, ainda não está a levar com a recessão. A desvalorização do euro vai facilitar a sua missão exportadora para outros mercados, mesmo quando os europeus deixarem de comprar coisas que se vejam.

Com toda esta conversa supostamente moral sobre dívida pública que intoxica o debate político, aqui e no resto da Europa, é natural que o leitor comum ache que a Alemanha tem “as suas contas em ordem” e já pagou, ou está quase a pagar, tudo o que deve. Mentira. Como disse Sócrates, também a Alemanha acha, evidentemente, que a dívida “é para se ir pagando”, e está longe de ter uma dívida pública baixinha, como a da Estónia, que é de 6,6% do PIB. Não: a dívida pública alemã é de 83,2% do PIB e é parecida com a francesa (81,7% do PIB). Mas tanto a dívida pública alemã como a dívida pública francesa são maiores do que a espanhola (60,1% do PIB). Sim, nós temos uma dívida terrível – 93% do PIB. Mas está apenas dez pontos acima dos alemães. A Bélgica está nos 96% e os casos mais complicados são a Itália – 119% – e a Grécia, a chegar aos 142,8%. A Letónia, por exemplo, um país que pagou as suas dívidas honrosamente (está nos 44% do PIB), tem agora uma taxa de desemprego de 18%.

Com a confiança na zona euro a bater no fundo, os investidores refugiam-se no colo de Berlim, que é a economia mais forte da zona euro. Aceitam perder dinheiro – negoceiam a juros negativos – para deterem dívida pública alemã. Como é que os outros países da zona, enfiados em programas de austeridade sem crescimento à vista, podem dar confiança aos investidores? A resposta, infelizmente, é conhecida. Se puder, emigre para Berlim.


Editorial do jornal i de 11-01-12,com o título "As dívidas boas e as dívidas más", por Ana Sá Lopes.Sublinhados meus .A imagem, retirada do jornal Público, mostra gráficamente a distribuição da dívida na zona euro. Por estes dados facilmente se conclui que a crise da dívida soberana portuguesa não é objectiva nem real. Ela foi criada pelas agências de rating e agrada à política de destruição do Estado social do PSD e CDS. Portugal tem uma dívida semelhante a outros países da zona euro, 10 pontos percentuais superior à Alemã, em termos de PIB. No geral, quem tem uma dívida colossal na zona euro é a Alemanha, a Itália e a França. A questão é, portanto, política - e só a acção política, no sentido abrangente, nos pode tirar da situação em que estamos. Mas pela apatia generalizada parece que há pessoas que gostam de ser roubadas, masoquistas que gostam de empobrecer. Enfim, a "servidão voluntária" tem raízes profundas.



segunda-feira, janeiro 02, 2012

6 ANOS

Este blogue faz hoje 6 anos. Agradeço aos leitores e visitantes.

LIVROS DE 2011


A=
O Pintor Debaixo do Guarda-loiça, Afonso Cruz, Caminho
Vim Porque me Pagavam, Golgona Anghel, Mariposa Azual
A Pantera, Ana Teresa Pereira, Relógio d’ Água
A Felicidade no Crime, Barbey D´ Aurevilly, Assírio & Alvim
Vida: Variações, Bénédicte Houart, Cotovia

B=
O Conformista, Alberto Moravia, Público
Romance Sujo, João Urbano, UR
Doutor Avalanche, Rui Manuel Amaral, Angelus Novus
O Filho do Lobo e outros contos, Jack London, Estrofe & Versos
S. Bernardo, Graciliano Ramos, Cotovia

C=
Almanaque do F. C. do Porto, Rui Miguel Tovar, Caderno
Contos Completos, Gabriel Garcia Marquez, Dom Quixote
O Colosso de Maroussi, Henry Miller, Tinta da China
Poesia Completa, Manoel de Barros, Caminho
O Lago, Ana Teresa Pereira, Relógio d´Água
Contos Escolhidos, Guy de Maupassant, Dom Quixote
Ferdydurke, Witold Gombrowicz, 7 Nós
Correr, Jean Echenoz, Cavalo de Ferro
Auto-de-Fé, Elias Canetti, Cavalo de Ferro
Tiago Veiga - Uma Biografia, Mário Cláudio, Dom Quixote
Liberdade, Jonathan Franzen, Dom Quixote
Uma Mentira Mil Vezes Repetida, Manuel Jorge Marmelo, Quetzal
Nervo, Diogo Vaz Pinto, Averno
Histórias de Imagens, Robert Walser, Cotovia

A – livros publicados em 2011 e lidos em 2011.
B – livros lidos em 2011, publicados noutros anos.
C - livros publicados em 2011, em Portugal, que não li mas poderia ter lido se.

sexta-feira, dezembro 23, 2011

O QUE DIZEM JORNAIS


Ler jornais, nesta altura do campeonato, pode tornar-se num acto deprimente, algo que pode levar-nos ao psiquiatra em busca de Prozac ou mesmo à psicanalista para nos levantar a libido (vd. Um método perigoso de David Cronenberg, um filme medíocre). Se Henrique Raposo, no Expresso de hoje, se queixa que as redacções dos telejornais estão cheias de perigosos esquerdistas que deturpam as palavras do nosso querido líder, já Pedro Lomba, no Público de ontem, arremete contra o deputado socialista Pedro Nuno Santos que terá dito que “se está a marimbar para os credores”. O argumento de Lomba é moral, e parece ser esse o novo argumento da direita portuguesa: temos que pagar a dívida, nem pensar em não o fazer, senão o que somos? Caloteiros, uma nação sem moral, sem crédito (no amplo sentido da palavra). Ora Lomba, como a restante direita, esquecem-se do exemplo da Islândia. Esquece-se Lomba e esquecem-se os telejornais, que na realidade não passam de pasquins tablóides obedecendo a Relvas e Balsemão e Pais do Amaral. Mas a direita no poder e o seu séquito mediático (cujo exemplo maior é Medina Carreira, na TVI, em quem deve ter encarnado o espírito de Salazar) teimam em achar que devemos pagar a dívida aos usurários da troika – e nem pensar em renegociar. Uma dívida que tem um juro de 44 por cento.
Vasco Pulido Valente é o expoente máximo da asneira na opinião publicada em jornais portugueses. Embora por vezes pareça padecer de uma demência senil, é sobretudo um profundo ódio e ressentimento contra Portugal e os portugueses que o movem nas crónicas da última página do Público ao fim-de-semana. Ao seu lado estão Maria Filomena Mónica e António Barreto. Se detestam assim tanto Portugal, porque não emigraram, porque não ficaram pela tão amada Inglaterra ou Suíça? A resposta é simples: lá não seriam ninguém, nem as universidades desses países lhes dariam lugar. Alguém que emigrou, acabando por se tornar professor numa universidade da província em França, foi Eduardo Lourenço. Lourenço vivendo entre França e Portugal, abraçou a neurose da portugalidade, algo que consiste em escrever sobre um assunto tão inefável como o que é ser português. Lourenço que queria ser romancista, mas escreve entre o ensaio e a filosofia, ganhou o prémio Pessoa 2011, do qual foi júri durante alguns anos. Lourenço escapou à mal afamada filosofia portuguesa, mas vai dizendo estas preciosidades tão ao gosto dos jornalistas: “Há uma frase de Nietzsche que gosto de recordar porque é muito crística e que diz que ‘só’ os túmulos conhecem a ressurreição. Portugal desceu ao túmulo. A história de Portugal é muito curiosa. Aí se vê a nossa tendência milagrenta. De que Portugal assenta num milagre”.
Podia continuar, mas já vai longo o post. Com jornais destes, de referência, propriedade dos senhores Azevedo e Balsemão, o melhor é ler jornais desportivos. Talvez se encontre a afirmação, de um treinador ou futebolista, que determinada vitória assentou num milagre.

terça-feira, dezembro 20, 2011

QUERIDOS LÍDERES

(Pedro Passos Coelho)
(Kim Jung-un, 29 anos, novo líder da Correia do Norte)
(Angela Merkel, Chanceler da Alemanha desde 2005)
(Raymond W. McDaniel, CEO da Moody's)
(Stephen W. Joynt, CEO da Fitch)

(Douglas L. Peterson, CEO da Standard & Poor's)

quarta-feira, novembro 30, 2011

PAULO DA COSTA DOMINGOS


Um cordão policial, na socialização
da falência, debrua as sanefas.
Julga-se que a lógica é
salvar os ricos e esperar

que eles deixem cair,
dos seus sacos a abarrotar
de dinheiro, algum
na praça pública.

***

Coragem. Simulacro por
simulacro, qualquer um pode
ter um brinquedo destes
para sair ao domingo. Só que

com menos motor, menos ideias.
Talvez por decreto d'óbito e
acordo da cristandade e de outros
ela morra: a economia de mercado.

Paulo da Costa Domingos, Averbamento, & etc, 2011.

quarta-feira, novembro 02, 2011

AFONSO CRUZ


A visão do céu era ainda mais fantástica do que aquela que tinha tido no balão de observação durante a Primeira Guerra Mundial. As pessoas eram ainda mais pequenas e chegavam mesmo a não existir. Quanto mais se sobe, mais as pessoas desaparecem. Os governos não sabem que as pessoas existem, de tão em cima que estão. Falam do povo, mas é uma entidade abstracta, tal como nós falamos de Deus. Ninguém, lá do alto da governação, sabe se o povo realmente existe, é uma questão de fé. Chega-se até a descrever as suas características e a temê-lo, mas nunca ninguém o viu, senão uns místicos que desceram ao nosso nível e que acabaram descredibilizados e ridicularizados. O místico diz que o povo sofre e que é preciso mais justiça e que cada pessoa tem uma vida e não são uma Unidade, mas que são, isso sim, pessoas realmente separadas umas das outras, com existência própria. Ele, como um profeta do fim dos tempos, avisa os seus congéneres de que o povo pode ser perigoso e pode derrubar coisas muito altas. É preciso não esquecer, diz ele com o dedo esticado para baixo, que, por mais alta que seja uma árvore, o seu tronco mantém-se ao alcance de um machado. Mas ninguém dá ouvidos ao mistico que viajou até à terra e a sua carreira política termina imediatamente e de forma ultrajante.

Afonso Cruz, O Pintor Debaixo do Lava-Loiças, Caminho, 2011, pp.147-8

sábado, outubro 22, 2011

O PIOR POEMA DA LITERATURA PORTUGUESA


Alma minha gentil, que te partiste
Tão cedo desta vida, descontente,
Repousa lá no Céu eternamente
E viva eu cá na terra sempre triste.

Se lá no assento etéreo, onde subiste,
Memória desta vida se consente,
Não te esqueças daquele amor ardente
Que já nos olhos meus tão puro viste.

E se vires que pode merecer-te
Alguma cousa a dor que me ficou
Da mágoa, sem remédio, de perder-te,

Roga a Deus, que teus anos encurtou,
Que tão cedo de cá me leve a ver-te,
Quão cedo de meus olhos te levou.

Luís de Camões

Nota: é evidente que há muitos maus poemas, mesmo entre os poetas canónicos da literatura portuguesa, mas a cacafonia do primeiro verso associada à ideia e, sobretudo palavras (alma, minha, gentil, partiste), têm dado um forte contributo para o ódio à poesia, aprendido nas escolas por sucessivas gerações.

sábado, outubro 15, 2011

15O - INDIGNAÇÃO MUNDIAL

Lisboa
Zurique
Hong Kong
Sidney
Hong Kong
Seul, Coreia do Sul
Barcelona
Madrid
Roma

(Fotos do Diário de Notícias, The Guardian, El Pais, agências)