segunda-feira, setembro 23, 2013

ANTÓNIO RAMOS ROSA (1924-2013)

 ESTOU VIVO E ESCREVO SOL

Eu escrevo versos ao meio-dia
e a morte ao sol é uma cabeleira
que passa em fios frescos sobre a minha cara de vivo
Estou vivo e escrevo sol

Se as minhas lágrimas e os meus dentes cantam
no vazio fresco
é porque aboli todas as mentiras
e não sou mais que este momento puro
a coincidência perfeita
no acto de escrever e sol

A vertigem única da verdade em riste
a nulidade de todas as próximas paragens
navego para o cimo
tombo na claridade simples
e os objectos atiram suas faces
e na minha língua o sol trepida

Melhor que beber vinho é mais claro
ser no olhar o próprio olhar
a maravilha é este espaço aberto
a rua
um grito
a grande toalha do silêncio verde

António Ramos Rosa, "Estou vivo e escrevo sol", poema publicado pela primeira vez no livro com o mesmo título de 1966.


AS PALAVRAS VITAIS PULSANDO NO POEMA



António Ramos Rosa era um dos últimos grandes poetas portugueses. Esta afirmação aparentemente banal numa altura como esta tem a sua justificação. Embora sendo um poeta maior, pela sua necessidade de uma respiração poética que o parecia alimentar como o ar, como a “facilidade do ar” – título de um dos seus livros –, Ramos Rosa tornou-se em certo sentido um poeta “marginal”. Marginal porque editou cerca de 100 livros, a maioria dos quais em pequenas editoras, mas também porque a sua pulsão poética, marcada pelo desejo – desejo do poema e no poema em primeiro lugar, como acto de afirmação, acolhimento e plenitude – não seria bem vista a partir de um momento em que a poesia portuguesa começa a ser marcada por um tom narrativo, pela melancolia e posteriormente por um niilismo de pulsão tanática. É certo que a poesia – portuguesa e não só, sempre foi marcada por pulsões de morte. No entanto, António Ramos Rosa, embora só iniciando a publicação em livro em 1958, com o livro O Grito Claro (título que encerra todo um programa), pertence a uma geração de grandes poetas portugueses que iniciaram o seu percurso ainda durante a II grande guerra: Sophia, Eugénio de Andrade ou Jorge de Sena. 
 É fundamentalmente a forma como é editado e a sua pulsão poética, que o leva a escrever milhares de poemas, que o tornam um poeta que pode parecer repetitivo ao leitor desatento da sua obra. E no entanto, a obra poética de Ramos Rosa está à altura da de Sophia, Sena, Eugénio ou Herberto. 
Essa obra é marcada por uma extrema modernidade, uma alta modernidade – e repare-se na influência que Ramos Rosa exerceu sobre os poetas de Poesia 61 de que é testemunho Gastão Cruz. O autor de Acordes (1989) foi desde cedo um teórico do poema. Daí resultaram alguns dos principais livros de ensaio da poesia portuguesa: Poesia, Liberdade Livre (1962), Incisões Oblíquas (1987) ou A Parede Azul (1991). Nestes livros, a respiração poética fazia-se quer através de uma teorização do poema, quer através do diálogo com a obra de outros poetas – e esse diálogo, já sob a forma de poema, foi particularmente fecundo em livros como A Imobilidade Fulminante (1998) em diálogo com Rosa Alice Branco. Mas a teorização da poesia, de que os textos iniciais de A Parede Azul são um dos pontos mais altos, bem como as múltiplas artes poéticas espalhadas pela sua vasta obra, falam-nos de uma poesia autotélica e de uma insurreição: “a poesia é uma invenção livre e aberta mas é ao mesmo tempo uma insurreição vital”, lemos na página 15 de A Parede Azul. Assim se compreende que os primeiros poemas, como “O boi da paciência”, que fizeram Eduardo Lourenço classificar a poesia de António Ramos Rosa como realista, até livros finais como Génese Seguido de Constelações (2005) mantenham ainda que de forma diferente essa linha de resistência, que é ao mesmo tempo uma forma de insurreição contra “os discursos que a sociedade produz […] os seus estereótipos, as suas normas e conceitos”. É contra este mundo desvitalizado que Ramos Rosa escreve. Mas estar contra essa desvitalização implica que o poema é também um lugar de pensamento – e nesse sentido há uma ligação em Ramos Rosa entre poesia e filosofia.  
De António Ramos Rosa, ficam as palavras, as palavras vitais pulsando nos seus poemas. E enquanto existir uma civilização, essas palavras ecoam como um desejo eterno de vida: “Estou vivo e escrevo sol”.

quarta-feira, setembro 04, 2013

SÃO EMPRESAS PORTUGUESAS COM CERTEZA

Aqui se publica a lista das empresas portuguesas, cotadas no PSI-20, que têm sede na Holanda e ai pagam os seus impostos. Ao fugirem para a Holanda estas empresas beneficiam de um regime fiscal mais atractivo (impostos mais baixos), e simplesmente não pagam imposto (IRC) em Portugal. Ou seja, roubam descaradamente o Estado português e fazem o que as outras empresas portuguesas, pequenas e médias, não podem fazer. Não se trata apenas de concorrência desleal e imoral. O país precisa do dinheiro destas empresas que operam em Portugal, estão na bolsa portuguesa e vendem os seus produtos a portugueses. O governo não faz nada contra esta situação. A este estado de coisas não é estranha a chamada "dança das cadeiras": os executivos que destas empresas vão para o governo e do governo para estas empresas num regime de promiscuidade político-empresarial. Na verdade, podemos dizer que não vivemos numa democracia mas numa oligarquia empresarial constituída por cerca de duas dezenas de empresas. E os cidadãos que fazem contra esta situação, ocultada pelos meios de comunicação social que se divulgassem esta situação correriam o risco de perder a publicidade destas empresas? Nada. Torna-se, pois, importante, 1) divulgar esta escandalosa situação e 2) apelar para um boicote aos produtos destas empresas. A situação é demasiado imoral: o governo aumentou de forma "colossal" os impostos (além de acabar com o 13º mês, subsidio de férias e baixar as pensões, entre outras maldades), mas estas empresas lideradas por "patriotas" como Alexandre Soares dos Santos (Jerónimo Martins), Belmiro de Azevedo (Sonae) ou Ricardo Salgado (BES) apenas pensam nos seus lucros.

Eis a lista (com as empresas e as sociedades em que o grupo empresarial se divide):
- BCP detém a sociedade BCP Investment B.V.;
- PT detém as sociedades Bratel Brasil, Bratel TV, Africatel e PT International Finance BV;
- SONAECOM detém: Sonaecom BV (que detém uma parte da Optimus) e Sonaetelecom BV (detém jornal Público);
- SONAE detém: Soflorin BV, Sonvecap BV, Sonae Investments BV e Sontel BV;
- EDP detém EDP Finance BV;
- CIMPOR detém Cimpor BV;
- BRISA detém Brisa Finance BV, Brisa International BV, Brisa International Invest BV;
- SONAE INDÚSTRIA detém Megantic BV;
- GALP detém Galp Energia E&P BV e Galp Energia Port. Holdings;
- MOTA-ENGIL detém ME Brand Management e Tabella Holding;
- SEMAPA detém Seinpar Investments BV, Interholding Invest. BV, Parcim Invest. (grupo Secil) e Seciment Investments (Secil);
- PORTUCEL detém Megantic BV.

4 grupos têm sociedades com sede noutras cidades da Holanda (Roterdão e Amstelveen):
- BCP detém Bitalpart BV e BBG Finance BV, em Roterdão;
- JERÓNIMO MARTINS detém a Belegginsmaatschappij Tand em Roterdão;
- ZON detém a Teliz Holding BV em Amstelveen;
- SONAE INDUSTRIA detém SCS Beheer em Amstelveen.

"O BES é o grupo com mais sociedades sediadas no estrangeiro (10), especialmente em paraísos fiscais, seguindo-se o BANIF com sociedades em 9 países. O BES detém 7 empresas sediadas nas Ilhas Caimão, conhecido paraíso fiscal, e o BANIF 6."

"A sociedade TAND, do grupo Jerónimo Martins e com sede em Roterdão, detém 100% da JM Dystrybucja, que por sua vez detém a Biedronka, a rede de supermercados dominante no comércio retalhista do ramo na Polónia. Esta rede de supermercados na Polónia é a principal fonte de receitas do grupo Jerónimo Martins com vendas de 4,3 mil milhões de euros nos primeiros nove meses de 2011 (59,1% do total do grupo)."
Respigado de Esquerda.net
 (Em cima logo da Sonae, uma das empresas com mais sociedades na Holanda)