O almirante (ou ex-almirante) Henrique
Gouveia e Melo, depois de ter organizado a vacinação de milhões de portugueses
contra a covid, num cenário de ficção científica, tornou-se num mito
sebastianista. Esse mito foi alimentado pelos meios de comunicação social como
candidato às eleições presidenciais de 2026. E eis que o militar submarinista,
já no ano passado, aparecia em primeiro lugar nas sondagens. O próprio Gouveia
e Melo, em entrevistas, não descartou a hipótese de uma candidatura. Agora,
depois do artigo publicado pelo almirante no Expresso de 21 de Fevereiro, não
restam dúvidas que Gouveia e Melo será candidato às próximas eleições
presidenciais. Só falta oficializar a candidatura, como já fez Marques Mendes e
Mariana Leitão (candidata apresentada pela IL).
A
grande questão que se colocava aos comentadores políticos sobre a candidatura
do militar submarinista, era saber quais as suas ideias políticas, como se
posicionava no espectro político: é de esquerda? De direita? Um populista?
Ninguém sabia. Afinal ficamos a saber que o submarinista pesca eleitorado entre
o socialismo e a social-democracia, portanto ao centro que é onde há mais
peixes. Mas porque se interrogavam, antes deste artigo tão minuciosamente
analisado, os comentadores políticos? Será que não sabem o que é o you tube? É
que por lá andam vídeos com as ideias de Gouveia e Melo. As ideias do
submarinista candidato a candidato a presidente da República Portuguesa, enfim
a grande ideia, que poderá fazer de Henrique Eduardo Passaláqua de Gouveia e
Melo o novo Infante D. Henrique, é colonizar o mar. Colonizar talvez não seja
bem a palavra certa, mas os peixes não vão gostar. Diz Gouveia e Melo num TEDx
que o “ser humano, antes de ir para o
espaço, vai habitar o mar” e isto antes de 2050, pelos cálculos do militar
agora na reserva. No mesmo TEDx Gouveia e Melo fala de “cidades flutuantes”.
Mais, “vamos passar de um mundo terreno para um mundo oceanocêntrico”. Para o
ex-almirante “não devemos chamar a este planeta Terra, mas Água” porque 2/3 do
planeta é constituído por água. Nesse TEDx, realizado no Porto, Henrique
Gouveia e Melo faz o elogio do Infante D. Henrique, nascido na cidade do Porto.
Este
homem andou durante mais de 40 anos debaixo de água, em submarinos. Em criança
certamente leu as 20 Mil Léguas Submarinas de Jules Verne. Chegou à mais alta patente das forças
armadas, foi empurrado por um vírus para a ribalta mediática, e agora, quer ser
presidente da República. Mais, numa atitude megalómana, quer ser um novo
Infante D. Henrique. Isto é política, ou ficção científica? As duas coisas. Mas
os comentadores políticos só percebem de política em terra. Não são capazes de
ver que temos aqui um Elon Musk (sem saudação nazi) português. O submarinista
mete água? Claro, é uma espécie de Homem da Atlântida (série que passou na tv
portuguesa nos anos 80). Henrique Passaláqua (repare-se neste nome, que contém
áqua = água) é água por todos os lados. Com as sondagens que tem, a simpatia do
eleitorado feminino, já foi eleito presidente, 11 meses antes das eleições. Mas
o que fará um homem da água no palácio de Belém? Será que vai atirar com 10
milhões de portugueses borda fora para ocupar as cidades marítimas ou
flutuantes? Teremos presidências não abertas, mas fechadas dentro do exíguo
espaço de um submarino?
Na
verdade – ou na mentira – o ex-almirante é uma fabricação mediática resultante,
como já foi dito, da vacinação contra a covid. Como tal foi possível? Não é uma
atitude de total irresponsabilidade por parte dos meios de comunicação social
atirar para a corrida presidencial um militar sobre o qual eram – e continuam a
ser – desconhecidas as ideias políticas. Porque Gouveia e Melo atira para um
eleitorado do centro, um espaço muito amplo; porque Gouveia e Melo com a sua
atitude autoritária chegou a ser pensado pelo Chega para ser o candidato
apoiado pelo partido de André Ventura (que também foi uma criação mediática até
se tornar um elefante no meio do parlamento).
No
artigo publicado no Expresso aparece uma ideia nova: a de demitir o governo
quando este não cumprir com as promessas eleitorais, algo que foi bastante
evidente com o governo de Passos Coelho/Paulo Portas, mas também com governos
anteriores. Aqui é o governo que mete água, e de forma significativa nos
últimos 50 anos de democracia. Confesso que esta ideia me agrada, um candidato a
primeiro-ministro não pode dizer que vai baixar os impostos na campanha
eleitoral e, quando alcançar o poder subir a carga fiscal. Ou seja, não pode
mentir ao seu eleitorado, tem que ser fiel às suas promessas eleitorais.
Mas
no geral, e faltando ainda muito tempo para as eleições presidenciais, mas
tendo em conta as declarações que se podem encontrar no you tube por Gouveia e
Melo, quer pelo facto deste pertencer a uma cultura militar, marcada pela
disciplina, não parece trazer nada de bom para a democracia portuguesa
(bastante fragilizada no mundo de Trump & Musk). Já tivemos a experiência
de um militar na presidência da república, Ramalho Eanes eleito para o primeiro
mandato em 1976, mas esses eram tempos diferentes, e Eanes tinha sido um dos
vencedores do 25 de Novembro de 1975, contra um golpe da extrema-esquerda –
portanto era conhecida a sua posição política. De Gouveia e Melo sabemos que é
um submarinista, e talvez aproveite o cargo de presidente da República – se lá
chegar – para usar a sua “magistratura de influência” no sentido de construir
as “cidades flutuantes”. Uma ideia mirabolante de ficção científica. Uma ficção
científica que estará sempre ao serviço do capitalismo, como o almirante
Gouveia e Melo.