sábado, novembro 30, 2019
João Miguel Fernandes Jorge
Ia pela ponte de Waterloo
passou um milénio sobre o teatro
tudo era luz.
Parámos na fábrica dos azulejos os fumos
cobrem as ruas vêm dos esgotos movem-se
«e também há alguns autênticos
verdadeiros americanos, são russos.»
Uma rapariga tem sempre a sua música
leva o dinheiro apertado num saco bordado
o retrato da amada na outra mão.
Podia muito bem ter pintado o rei nesse outono
não havia heróis nem escudos
os temas estavam tão batidos aproveita-se o
contrabaixo um negro igual a todos vai
pelas ruas sem nenhum proveito
já nem sequer ouvia a voz dos dedos.
Acabei de ler algumas frases
do meu caderno. O Auden do trompete
assobiava. Tinha um sweater de lã
muita tosse. Um olhar de alegria seguia de
novo o novo tema.
quinta-feira, outubro 31, 2019
PARLAMENTO DE SAIOTE
Resultante das eleições
legislativas do passado dia 6 de Outubro, entraram para o novo parlamento mais
3 partidos, cada um com um representante: o Chega de André Ventura, de
extrema-direita, defendendo posições que nem o Estado Novo adoptou, como a
prisão perpétua, entrou em parte porque Ventura foi “apoiado” pelo Correio da
Manhã e pela CMTV (todo um mundo alternativo recheado de populismo fascista); o
Iniciativa Liberal, representado por Cotrim Figueiredo, cujo nome, apesar de
ter ideias novas, diz dos seus propósitos; e o Livre, partido liderado pelo
historiador e comentador político Rui Tavares (que já foi eurodeputado pelo BE),
que conseguiu colocar no parlamento a cabeça de lista por Lisboa, Joacine
Katar-Moreira.
No que respeita aos resultados
destas eleições para uma nova legislatura, a vitória do PS, sem maioria
absoluta, em nada surpreendeu. A governação do PS com o apoio de CDU e BE, reflectiu
um inflexão no discurso de empobrecimento que o governo de Passos Coelho
imprimiu ao país com a ajuda e o argumento da Troika. A grande derrota da
direita, com o quase desaparecimento do CDS-PP (partido rebaixado a 5 deputados)
e mau resultado do PSD (que só não foi pior porque Rio Rio fez uma deriva para
o centro-esquerda, tentando aproximar o partido do PS) deve-se à natural
resposta governativa de António Costa, de que afinal existia uma alternativa e
os portugueses não estavam condenados ao discurso enunciado por Passos e o seu
governo. Costa, agora homem-do-leme pôs dinheiro a circular na economia (a
ponto de dados divulgados hoje referirem que os portugueses nunca pouparam tão
pouco como desde 1961). No entanto, e para lá das catástrofes climáticas que
originaram a maior mortandade em incêndios em Portugal, cerca de 100 pessoas em
2017, Centeno, como ministro das finanças, e depois presidente do Euro-grupo,
foi o outro lado da moeda de uma austeridade encapotada que recaiu sobre os
serviços públicos, e que ameaça fazer colapsar o Estado providência tão
apregoado pela esquerda maioritária neste parlamento. Assim, sem geringonça, e
ainda o PSD dependente de eleições internas, não se adivinha fácil a
legislatura de António Costa.
A verdade, apesar de enfatizada
pelos média, é que também Portugal foi atingido pela mudança no cenário
partidário, que atingiu já há muito países europeus como a Espanha, a Itália, a
França, etc. Pela primeira vez depois do 25 de Abril, o parlamento português
tem 10 partidos (contando com o deputado do PEV, que foi eleito nas listas da
CDU). Estas mudanças, que têm tornado a Espanha ingovernável, e fazer crescer a
ameaça populista da extrema-direita, são manifestações de descontentamento dos
eleitores para com os seus representantes que continuam encapsulados nos seus
interesses, nos interesses de grandes organizações financeiras, e nos
interesses dos seus partidos, e não – como devia ser – nos interesses das
pessoas. Isto explica a elevada abstenção, e o voto em novos partidos, como o
PAN que conseguiu um pequeno grupo parlamentar, ou mesmo, à espera de um melhor
resultado em próximas eleições, os partidos que conseguiram colocar um deputado
no parlamento.
Entre os 3 partidos que estão
na situação referida, Chega, Iniciativa Liberal e Livre, o primeiro representa,
como o Voxx em Espanha, e muitos partidos semelhantes, de que um dos casos mais
graves é o AfD alemão, uma ameaça para a democracia. Quanto ao IL, representa
apenas uma ameaça para o CDS e para o PSD. Vou focar-me, ainda que brevemente,
no caso do Livre. Se há quatro anos Rui Tavares conseguiu juntar ao seu partido
figuras vindas do BE como Ana Drago e Daniel Oliveira, tendo nas fileiras do
partido uma figura importante da democracia e da historiografia portuguesas,
como é o caso do falecido José Tengarrinha, de nada lhe valeram essas figuras
que pareciam estruturar um novo partido na esquerda portuguesa entre o PS e o
Bloco. As eleições internas para estas legislativas mudaram o rumo do partido.
Com Joacine Katar-Moreira assiste-se a uma forma de fazer política baseada na
provocação, que atira o partido para uma radicalidade que não era a sua
original. Anda esta provocação de Katar-Moreira, entre uma discernível base teórica
que repousa entre Foucault e Lacan, mas acaba por seguir a moda da estação:
Judith Butler numa versão misturada com a teoria pós-colonialista. São
conhecidas as formas de provocação de Katar-Moreira: a gaguez com a qual ela
afirma se dar bem causa consternação nos ouvintes e um discurso pobre, em que
se adivinha a palavra que vem a seguir. Lacan chamaria a isto gozo (juissance).
A outra provocação foi feita pelo assessor de Joacine, que na abertura desta
legislação acompanhou a deputada do Livre vestido com uma saia. Uma minoria
tem, em democracia, direitos, mas esses direitos não se podem impor ao respeito
pelas maiorias. Quando isso aconteceu, nos países em que isso aconteceu,
estivemos perante a barbárie. Em Portugal 2019, país de brandos costumes, estamos
apenas perante um equívoco entre a Moda Lisboa e a Assembleia da República.
segunda-feira, setembro 30, 2019
BREVIÁRIO SOBRE OS PARTIDOS CONCORRENTES ÀS LEGISLATIVAS
Até que ponto estas eleições legislativas do
próximo dia 6 de Outubro são decisivas? O que vai mudar na vida dos portugueses?
A resposta, tendo em conta que o vencedor antecipado é o PS, será muito pouco.
António Costa ao criar a geringonça abriu um espaço de entendimentos
parlamentares único na democracia portuguesa. Daí que com excepção do CDS, e de
um eventual novo líder do PSD, mesmo sem maioria absoluta o PS tenha toda a
margem de manobra para criar uma solução governativa. Ou seja, para criar uma
nova geringonça.
Mas calma. Ainda vamos na campanha. E na campanha
eleitoral, naturalmente mediática, não há 21 partidos a concorrer mas apenas os
6 com representação parlamentar. É claro que há problemas de logística para
acompanhar em igualdade os 21 partidos, mas já agora que critérios editoriais
fazem com que apenas os 6 partidos que têm representação parlamentar sejam
acompanhados pelos meios de comunicação social? E que o PAN, com apenas um
deputado, tenha o mesmo tratamento que o BE ou o CDS, partidos com grupos
parlamentares. Sem dúvida que o PAN vai aos ombros dos jornalistas.
Dito isto, que é uma evidência difícil,
vejamos os partidos e se existem razões para votar em algum deles.
PS – António Costa mostrar-se como a noiva
com quem todos querem casar (mesmo Rui Rio). Durante estes 4 anos distribuiu
dinheiro, mudando bastante o país. Mas não foi suficiente: os serviços públicos
continuaram sem dinheiro. De uma forma grave. Centeno apostou numa austeridade
encapotada, e em devolver ao FMI o dinheiro emprestado. Deste governo só se
pode dizer que foi bom porque veio depois do pior governo depois do 25 de
Abril.
PSD – Depois desse terrorista que foi Passos
Coelho, os portugueses perceberam que tipo de partido é o PSD. Não totalmente.
Rio tentou virar à esquerda, não é suficiente. É o seu lugar como líder do
partido que se joga nestas eleições.
Bloco de Esquerda – O apoio ao PS, à
geringonça, fê-lo engolir muitos sapos e deixar de lado a luta por causas
justas. Ainda tem uma visão demasiado estatizante da sociedade.
PCP (CDU) – Creio que nem Soares nem Cunhal
concordariam com a solução da geringonça. É um partido estalinista, com quase
um século, anquilosado, que ainda apoia regimes como o da Coreia do Norte.
CDS-PP – Dos seis partidos parlamentares é o
único que não quer casar com António Costa. Tem uma ideia filosófica de
liberdade. Mas a justiça social, onde fica? Para as grandes empresas.
PAN – Da libertação animal de Peter Singer
(bio-eticista a favor do aborto, do infanticídio, do “homicídio” de pessoas com
doenças neurológicas que lhes façam perder a “consciência”) a um partido que se
diz agora ecologista. Se os animais votassem ...
Livre – Tem um programa utópico e a primeira
candidata gaga a querer entrar no Parlamento.
Aliança – Ou seja, Pedro Santana Lopes.
PDR – Já podia ter entrado no Parlamento, mas
Marinho Pinto prefere os programas da manhã da TVI.
PTP – Tem algumas boas ideias. Mas como se
pode subir o salário mínimo para 1000 euros?
PNR – Puro fascismo.
Iniciativa Liberal – Já chegou o
neoliberalismo de PSD/CDS.
Nós, Cidadãos – Ainda não se explicou.
MAS – Esquerda quase caceteira.
RIR – Ou seja, Tino de Rãs, um mau Da Vinci
dos mass-média.
Chega – Um perigo para a democracia. Puro e
do pior populismo, a reboque do Correio da Manhã.
JPP – Um partido da Madeira.
MPT – Tem um bom tempo de antena. No resto,
está invisível.
PURP -
A idade não é um posto.
PCTP/MRPP -
A nova líder do partido vai fazer uma revolução. Mas em casa dela.
PPM – Um partido sem rei.
sábado, agosto 31, 2019
Mário Henrique Leiria
GIN SEM TÓNICA
Uma garrafa de gin
estava a preocupar
o pescador
a garoupa e o rodovalho
não tinham aparecido
pró jantar
que fazer?
telefonou ao ministro
da Pesca e do Trabalho
mas o ministro
estava a trabalhar
na cama
com a mulher
foi então
que a garrafa de gin
sugeriu discretamente
porque não
telefonar ao presidente?
telefonaram
o presidente da nação
estava em acção
na cama
com a mulher
nessa altura
até que enfim
encontraram a solução
o pescador
foi para a cama
com a garrafa de gin
De Contos do Gin-tonic, Estampa, 2ª ed., 1976.
quarta-feira, julho 31, 2019
Lídia Jorge
.
CAI A CHUVA NO PORTAL
Cai a chuva no portal, está caindo
Entre nós e o mundo, essa cortina
Não a corras, não a rasgues, está caindo
Fina chuva no portal da nossa vida.
Gotas caem separando-nos do mundo
Para vivermos em paz a nossa vida.
.
Cai a chuva no portal, está caindo
Entre nós e o mundo, essa toalha
Ela nos cobre, não a rasgues, está caindo
Chuva fina no portal da nossa casa.
Por um dia todos longe e nós dormindo
Lídia Jorge é desde O Dia dos Prodígios (1980) autora de mais de uma dezena de romances, e alguns livros de contos, volumes, onde tem ficcionado a realidade histórica portuguesa do pós 25 de Abril. A autora, nascida em Boliqueime em 1946, estreou-se na poesia, recentemente, com Livro das Tréguas (D. Quixote).
.
domingo, junho 30, 2019
REUTILIZAÇÃO DA ESTUPIDEZ
A ideia do PS, plasmada no OE para 2019, de
reutilização dos manuais escolares é uma ideia estúpida e sintomática de uma
concepção de escola como um processo burocrático, ou um depósito de crianças e
adolescentes. Diferente da ideia do PS era o projecto apresentado pelo PCP, que
previa a dádiva pelo Estado aos alunos dos manuais sem que estes tivessem de
ser entregues no final do ano lectivo. Mas isso seria um desperdício que Mário Centeno
não poderia permitir.
Sobre os manuais escolares, deve dizer-se que
foram sempre uma forma de aproveitamento económico por parte das editoras que
os publicam – como é o caso da Porto Editora, que sendo a maior editora,
durante anos, a editar manuais escolares, se tornou, agora, no maior grupo
editorial e livreiro do país. Esse aproveitamento consiste no uso de papéis
caros, no uso abundante da cor, o que encarece o manual, e faz com que os
livros escolares pesem mais que os outros livros, tendo as crianças e
adolescentes que transportar um peso significativo nas mochilas. Ou seja, os
manuais escolares apresentam-se como livros de arte, ou enciclopédias
ilustradas. Daqui resulta que as primeiras experiências, na generalidade, com o
livro, por parte das crianças, não são boas. Não só pela questão do peso, mas
sobretudo porque os livros apresentam um saber, incipiente, muitas vezes
marcado ideologicamente, que vai ser objecto de um exame, sob cuja performance
é atribuída uma nota ao aluno. É assim que toda a possibilidade de pulsão
epistemofílica, de interesse pelo saber, é castrada pela escola.
Ora, o deficiente saber, o saber deturpado,
mas ainda uma narrativa de um saber, uma possibilidade do reaparecimento da
pulsão epistemofílica – mesmo por outros membros da família – fica amputado
quando os manuais escolares são devolvidos para reutilização. Porque em muitas
casas portuguesas os únicos livros que existem são, por obrigação, os manuais
escolares. Se tivermos em conta os dados recentemente divulgados, que dizem que
os filhos das famílias mais pobres vão para os cursos com menos prestígio (os
dos politécnicos), temos a evidência prática da política dos manuais reutilizáveis.
sexta-feira, maio 31, 2019
ABSTENÇÃO
O semanário
Expresso da passada sexta-feira, 24, trazia como manchete uma sondagem que
indicava que 69 por cento dos portugueses não eram capazes de nomear nenhum
candidato às eleições Europeias do passado Domingo. Ora, foi sensivelmente este
o número da abstenção destas eleições, um número que se tomarmos por correcto
constitui o recorde da abstenção em eleições desde o 25 de Abril (Luís
Aguiar-Conraria, no Público de dia 29, serve-se de um outro argumento, os
portugueses que residem no estrangeiro, e cuja taxa de abstenção “perfeitamente
normal” foi de 99 por cento, para fazer umas estranhas contas que colocariam a
abstenção na ordem dos 60 por cento).
Da citada manchete do Expresso infere-se um provável nexo de
causalidade: os portugueses que não sabiam quem eram os candidatos não foram
votar. É justo. Porque, embora o voto seja universal para todos os cidadãos
maiores de 18 anos, não faz sentido que alguém que não tem nenhuma noção dos
programas dos partidos, ou sequer não sabe o que é o Parlamento Europeu, ou que
as eleições Europeias foram para o Parlamento Europeu, vá exercer o seu “direito”/”dever
de voto”. E aqui estamos perante um assunto que é urgente ser discutido: literacia política. Levantar a questão
de uma literacia política é levantar a questão de como as instituições se
apresentam no espaço público (e aqui, a UE tem defendido a sua opacidade e
complexidade burocratizante, enquanto os parlamentos nacionais se tornam mais
transparentes com os seus canais televisivos – veja-se a título de exemplo a
audição a Joe Berardo); é, também, questionar como os partidos fazem campanha e
se apresentam aos seus potenciais eleitores; ou ainda – e este item reveste-se
de particular importância – como os meios de comunicação social abordam nos
seus espaços informativos as questões políticas e institucionais; e, não menos
importante, como a escola explica o funcionamento das instituições.
Após o 25 de Abril, e depois com a estabilização democrática, a
democracia representativa tornou-se universal. Na primeira República apenas os
homens alfabetizados e os chefes de família podiam votar (curiosamente uma
mulher, Carolina Beatriz Ângelo, médica e viúva, invocando a sua condição de
chefe de família, conseguiu votar, tornando-se num caso absolutamente
excepcional até às eleições de 25 de Abril de 1975 para a Assembleia
Constituinte, onde as mulheres puderam votar pela primeira vez). Hoje, nas
democracias representativas ocidentais a taxa de abstenção ronda os 50 por
cento – foi também esta a taxa de abstenção média destas eleições tendo em
conta o conjunto dos (ainda) 28 estados membros da UE.
Mas, em Portugal, a abstenção para as eleições Europeias, desde a
década de 90 do século passado, apresenta números superiores aos 60 por cento,
sendo as eleições com maior taxa de abstenção. Porque razão isto ocorre? Uma
das possíveis explicações, alinhadas com outros países chamados eurocépticos,
como é o caso da Grã-Bretanha que tenta sair da União Europeia, é a que os não
votantes nas eleições Europeias em Portugal o fazem pelas mesmas razões que os
ingleses quiseram, em referendo, o Brexit. Não me parece que seja essa a razão.
A razão para o não voto dos portugueses, em particular nestas últimas
Europeias, creio que se prende com a opacidade institucional da UE. Esta falta
de transparência da UE só pode ser mudada por dentro, e o bom resultado que os
partidos de tendência ecologista obtiveram, embora ainda insuficiente, pode
servir para diminuir o peso que os partidos do centro, burocratizantes, têm no
Parlamento Europeu. Mas há razões específicas para a existência desta maioria
silenciosa: 1, a desconfiança em relação à UE terá aumentado depois da
intervenção da troika em Portugal, que era constituída pelo BCE e pela Comissão
Europeia; 2, um divórcio em relação à política portuguesa que foi caracterizada
nos últimos tempos por uma austeridade encapotada, com cortes promovidos pelo
ministro das finanças, Mário Centeno, que é ao mesmo tempo o presidente do
Eurogrupo. Esse divórcio acentuou-se com o descaramento da banca e dos grandes
devedores de que a audição a Joe Berardo no Parlamento foi paradigmática: como
se pode compreender que o Estado tenha emprestado milhares de milhões de euros
(cerca de 20 milhares de milhão) á banca para esta emprestar a estes
multimilionários sem nenhumas garantias, em operações obscuras. E como se pode
perceber que a mesma banca seja tão implacável para com aqueles que em
dificuldades, vítimas da crise, desempregados, perderam a casa sob a qual
tinham contraído empréstimo bancário? Daqui resulta, como estamos a assistir,
um braço de ferro entre a banca (cujo Banco de Portugal supremamente
representa) e o parlamento. Porque os políticos portugueses sabem que esta
situação se tornou intolerável, e terá repercussões nas legislativas de Outubro
próximo. Se, como escrevia o poeta e jornalista Eduardo Guerra Carneiro, “isto
anda tudo ligado”, não podemos descartar a influência da audição parlamentar a
Joe Berardo nos resultados das eleições Europeias.
terça-feira, abril 30, 2019
D. Dinis
__ Ai flores, ai flores do verde pino,
se sabedes novas do meu amigo!
Ai Deus, e u é?
__ Ai flores, ai flores do verde ramo,
se sabedes novas do meu amado!
Ai Deus, e u é?
Se sabedes novas do meu amigo,
aquel que mentiu do que pôs comigo!
Ai Deus, e u é?
Se sabedes novas do meu amado,
aquel que mentiu do qui mi á jurado!
Ai Deus, e u é?
__ Vós me perguntardes polo voss'amigo,
e eu bem vos digo que é san'vivo.
Ai Deus, e u é?
Vós me perguntardes polo voss'amado,
e eu bem vos digo que é viv'e sano.
Ai Deus, e u é?
E eu bem vos digo que é san'vivo
e seera vosc'ant'o prazo saído.
Ai Deus, e u é?
E eu bem vos digo que é viv' e sano
e seera vosc'ant'o prazo passado
Ai Deus, e u é?
domingo, março 31, 2019
Joan Zorro
Em Lixboa, sobre lo mar
barcas novas mandei lavrar,
ai mia senhor
velida!
Em Lixboa, sobre lo ler,
barcas novas mandei fazer,
ai mia senhor
velida!
Barcas novas mandei lavrar
e no mar as mandei deitar,
ai mia senhor
velida!
Barcas novas mandei fazer
e no mar as mandei meter,
ai mia senhor
velida!
(in Poemas Portugueses - Antologia da poesia portuguesa do séc. XIII ao séc. XXI, Porto Editora, p. 107)
Joan Zorro foi um jogral português que terá feito parte da corte de D. Dinis. São-lhe conhecidas 11 composições. Em 1967 Fiama Hasse Pais Brandão publica o livro Barcas Novas (ed. Ulisseia) que inclui o poema com o título homónimo, referindo-se à Guerra Colonial. Mas a marca intertextual de Joan Zorro na poesia de Fiama, não se ficaria por ai, publicando em 1974 "O Texto de João Zorro"
Joan Zorro foi um jogral português que terá feito parte da corte de D. Dinis. São-lhe conhecidas 11 composições. Em 1967 Fiama Hasse Pais Brandão publica o livro Barcas Novas (ed. Ulisseia) que inclui o poema com o título homónimo, referindo-se à Guerra Colonial. Mas a marca intertextual de Joan Zorro na poesia de Fiama, não se ficaria por ai, publicando em 1974 "O Texto de João Zorro"
quinta-feira, fevereiro 28, 2019
Francisco Sá de Miranda
O sol é grande, caem co’a calma as aves,
do tempo em tal sazão, que sói ser fria;
esta água que d’alto cai acordar-m’-ia
do sono não, mas de cuidados graves.
Ó cousas, todas vãs, todas mudaves,
qual é tal coração qu’em vós confia?
Passam os tempos vai dia trás dia,
incertos muito mais que ao vento as naves.
Eu vira já aqui sombras, vira flores,
vi tantas águas, vi tanta verdura,
as aves todas cantavam d’amores.
Tudo é seco e mudo; e, de mestura,
Também mudando-m’eu fiz doutras cores:
E tudo o mais renova, isto é sem cura!
Francisco Sá de Miranda viveu entre 1481 ou 1485 e 1558. Poeta maior da história da literatura portuguesa, perto de Camões, Bernadim Ribeiro, Gil Vicente. O soneto aqui apresentado é um dos mais famosos do autor e aquele com quem alguns poetas do século XX estableceram relações de intertextualidade, como é caso de Gastão Cruz.
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