quinta-feira, outubro 31, 2019

PARLAMENTO DE SAIOTE

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Resultante das eleições legislativas do passado dia 6 de Outubro, entraram para o novo parlamento mais 3 partidos, cada um com um representante: o Chega de André Ventura, de extrema-direita, defendendo posições que nem o Estado Novo adoptou, como a prisão perpétua, entrou em parte porque Ventura foi “apoiado” pelo Correio da Manhã e pela CMTV (todo um mundo alternativo recheado de populismo fascista); o Iniciativa Liberal, representado por Cotrim Figueiredo, cujo nome, apesar de ter ideias novas, diz dos seus propósitos; e o Livre, partido liderado pelo historiador e comentador político Rui Tavares (que já foi eurodeputado pelo BE), que conseguiu colocar no parlamento a cabeça de lista por Lisboa, Joacine Katar-Moreira.

No que respeita aos resultados destas eleições para uma nova legislatura, a vitória do PS, sem maioria absoluta, em nada surpreendeu. A governação do PS com o apoio de CDU e BE, reflectiu um inflexão no discurso de empobrecimento que o governo de Passos Coelho imprimiu ao país com a ajuda e o argumento da Troika. A grande derrota da direita, com o quase desaparecimento do CDS-PP (partido rebaixado a 5 deputados) e mau resultado do PSD (que só não foi pior porque Rio Rio fez uma deriva para o centro-esquerda, tentando aproximar o partido do PS) deve-se à natural resposta governativa de António Costa, de que afinal existia uma alternativa e os portugueses não estavam condenados ao discurso enunciado por Passos e o seu governo. Costa, agora homem-do-leme pôs dinheiro a circular na economia (a ponto de dados divulgados hoje referirem que os portugueses nunca pouparam tão pouco como desde 1961). No entanto, e para lá das catástrofes climáticas que originaram a maior mortandade em incêndios em Portugal, cerca de 100 pessoas em 2017, Centeno, como ministro das finanças, e depois presidente do Euro-grupo, foi o outro lado da moeda de uma austeridade encapotada que recaiu sobre os serviços públicos, e que ameaça fazer colapsar o Estado providência tão apregoado pela esquerda maioritária neste parlamento. Assim, sem geringonça, e ainda o PSD dependente de eleições internas, não se adivinha fácil a legislatura de António Costa.

A verdade, apesar de enfatizada pelos média, é que também Portugal foi atingido pela mudança no cenário partidário, que atingiu já há muito países europeus como a Espanha, a Itália, a França, etc. Pela primeira vez depois do 25 de Abril, o parlamento português tem 10 partidos (contando com o deputado do PEV, que foi eleito nas listas da CDU). Estas mudanças, que têm tornado a Espanha ingovernável, e fazer crescer a ameaça populista da extrema-direita, são manifestações de descontentamento dos eleitores para com os seus representantes que continuam encapsulados nos seus interesses, nos interesses de grandes organizações financeiras, e nos interesses dos seus partidos, e não – como devia ser – nos interesses das pessoas. Isto explica a elevada abstenção, e o voto em novos partidos, como o PAN que conseguiu um pequeno grupo parlamentar, ou mesmo, à espera de um melhor resultado em próximas eleições, os partidos que conseguiram colocar um deputado no parlamento.

Entre os 3 partidos que estão na situação referida, Chega, Iniciativa Liberal e Livre, o primeiro representa, como o Voxx em Espanha, e muitos partidos semelhantes, de que um dos casos mais graves é o AfD alemão, uma ameaça para a democracia. Quanto ao IL, representa apenas uma ameaça para o CDS e para o PSD. Vou focar-me, ainda que brevemente, no caso do Livre. Se há quatro anos Rui Tavares conseguiu juntar ao seu partido figuras vindas do BE como Ana Drago e Daniel Oliveira, tendo nas fileiras do partido uma figura importante da democracia e da historiografia portuguesas, como é o caso do falecido José Tengarrinha, de nada lhe valeram essas figuras que pareciam estruturar um novo partido na esquerda portuguesa entre o PS e o Bloco. As eleições internas para estas legislativas mudaram o rumo do partido. Com Joacine Katar-Moreira assiste-se a uma forma de fazer política baseada na provocação, que atira o partido para uma radicalidade que não era a sua original. Anda esta provocação de Katar-Moreira, entre uma discernível base teórica que repousa entre Foucault e Lacan, mas acaba por seguir a moda da estação: Judith Butler numa versão misturada com a teoria pós-colonialista. São conhecidas as formas de provocação de Katar-Moreira: a gaguez com a qual ela afirma se dar bem causa consternação nos ouvintes e um discurso pobre, em que se adivinha a palavra que vem a seguir. Lacan chamaria a isto gozo (juissance). A outra provocação foi feita pelo assessor de Joacine, que na abertura desta legislação acompanhou a deputada do Livre vestido com uma saia. Uma minoria tem, em democracia, direitos, mas esses direitos não se podem impor ao respeito pelas maiorias. Quando isso aconteceu, nos países em que isso aconteceu, estivemos perante a barbárie. Em Portugal 2019, país de brandos costumes, estamos apenas perante um equívoco entre a Moda Lisboa e a Assembleia da República.

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