DIÁLOGOS COM SOPHIA II
Sabemos que a noite
desfia as horas do dia
teceu e a manhã
irrompe irreversível e quase
singular e nada
do que acontece é solitário tudo
é eco e ressoa
E o inumerável é outro nome
para o mundo para o aguçado
revolver dos restos que nos restam
e do que neles resta
do entorpecido músculo do possível
A branda cegueira do inominável é outro nome
para as rugas do tecido de poeira e luz e espanto
da janela que por vezes habitamos em jejum
na manhã que sacode a exactidão
dos nomes e desperta coisa a coisa as ramagens
nítidas as mãos mundanas do que é eterno
e inteiro por instantes
Dos arranhados ecos
do estilhaçar das coisas
já no início estilhaçadas
Uma e outra vez na sucessão dos dias
erguem-se os ombros subitamente
nos intervalos dos tambores
do tempo tão dividido
num gesto fora de tempo e fora de uso
danço tropeço gesticulando para a verdade
Como é estranho tudo
saber – enquanto espero
neste canto do café com um livro
um lápis a luz de soslaio
sobre este canto da mesa –
a pouco
e no pouco saber e
de coisa em coisa
cerrar o punho do tempo
todo o tempo
fiado e desfiado
em torno de um instante
Sabêmo-lo.
É preciso reinventar o início
Miguel Cardoso, Que se diga que vi como a faca corta, Mariposa Azual, 2010, pp. 70-71
Que se diga que vi como a faca corta é o primeiro livro de Miguel Cardoso, autor que nasceu em 1976. Já apontado como uma das revelações poéticas do ano, em Miguel Cardoso encontramos uma poesia opaca, que recorre ao poema longo e a uma declarada intertextualidade (de que o poema reproduzido acima é um exemplo).
Sabemos que a noite
desfia as horas do dia
teceu e a manhã
irrompe irreversível e quase
singular e nada
do que acontece é solitário tudo
é eco e ressoa
E o inumerável é outro nome
para o mundo para o aguçado
revolver dos restos que nos restam
e do que neles resta
do entorpecido músculo do possível
A branda cegueira do inominável é outro nome
para as rugas do tecido de poeira e luz e espanto
da janela que por vezes habitamos em jejum
na manhã que sacode a exactidão
dos nomes e desperta coisa a coisa as ramagens
nítidas as mãos mundanas do que é eterno
e inteiro por instantes
Dos arranhados ecos
do estilhaçar das coisas
já no início estilhaçadas
Uma e outra vez na sucessão dos dias
erguem-se os ombros subitamente
nos intervalos dos tambores
do tempo tão dividido
num gesto fora de tempo e fora de uso
danço tropeço gesticulando para a verdade
Como é estranho tudo
saber – enquanto espero
neste canto do café com um livro
um lápis a luz de soslaio
sobre este canto da mesa –
a pouco
e no pouco saber e
de coisa em coisa
cerrar o punho do tempo
todo o tempo
fiado e desfiado
em torno de um instante
Sabêmo-lo.
É preciso reinventar o início
Miguel Cardoso, Que se diga que vi como a faca corta, Mariposa Azual, 2010, pp. 70-71
Que se diga que vi como a faca corta é o primeiro livro de Miguel Cardoso, autor que nasceu em 1976. Já apontado como uma das revelações poéticas do ano, em Miguel Cardoso encontramos uma poesia opaca, que recorre ao poema longo e a uma declarada intertextualidade (de que o poema reproduzido acima é um exemplo).
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