DECLARAÇÃO DE INTENÇÕES
Para aqueles que insistem diluir
isto que escrevo aquilo que eu vivo
é mesmo assim, embora aluda aqui
a requintes que com rigor esquivo.
À língua deito lume, o que invoco
te chama e chama além de ti, mas versos
são uma disciplina que macera
o corpo e exaspera quanto toco.
Fazer poesia é árido cilício,
mesmo que ateie o sangue, apenas pus
se extrai, nem nunca pela escrita
um sólido balança, ou se levita.
Então sobre o poema, o artifício,
a borra baça, a mim a extrema luz.
Margarida Vale de Gato, Mulher ao Mar, Mariposa Azual, Lisboa, 2010, p. 9.
Margarida Vale de Gato é tradutora e docente universitária na área da tradução. Mulher ao Mar é o seu primeiro livro de poesia, embora tenha anteriormente publicado alguns poemas em revistas. A inovação poética apresentada neste livro fez de MVG uma das revelações de 2010. Como escreve Hélia Correia no posfácio à 2ª edição de Mulher ao Mar, esta poesia “Não pretende dar origem ao irreconhecível mas ao reconhecível que se estranha, á familiaridade estilhaçada” (p. 73).
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