As democracias são sistemas políticos frágeis, porque aceitam todas as opiniões políticas, mesmo aquelas que vão contra um pensamento democrático. Por isso, por vezes a barbárie não necessitou de tomar o poder pela força - bastou-lhe a persuasão sobre as massas. Foi o que aconteceu com um dos regimes mais ignóbeis de todos os tempos, o nazismo na Alemanha no século passado. Um século depois, nuvens negras ameaçam as democracias. Um pouco por todo o lado, governos populistas de extrema direita são eleitos democraticamente, ou partidos de extrema direita ganham terreno onde menos se esperava. Está neste caso a AfD na Alemanha, precisamente o país que dado o seu negro passado se esperava que não tolerasse quaisquer movimentos de extrema direita, mas também o Vox em Espanha, e em Portugal o Chega, que uma sondagem do Correio da Manhã, publicada ontem, dava, ironicamente à frente do PCP, com mais de 6 por cento de votação.
Esta ascensão da extrema direita, que no caso português deve incluir, a partir de agora o CDS, por a sua nova direcção ter elementos que manifestaram publicamente a sua simpatia para com Salazar e a PIDE (Está neste caso um tal Abel Santos), e que é algo absolutamente vergonhoso para um partido que, embora encostado mais à direita do espectro político, é um partido fundador da democracia portuguesa. Ou seja, a própria direita tradicional encontra-se refém da extrema direita como pode acontecer em Espanha no caso de novas eleições darem uma maioria à direita. Em Portugal, embora o Chega só tenha um deputado e o CDS seja um partido em aparente extinção, também esse cenário se começa a desenhar. Depois desta maioria de esquerda, como será uma provável maioria de direita?
Neste sentido, assistimos a uma falta de pragmatismo por parte da esquerda em lidar com esta nova extrema direita, inédita desde o 25 de Abril. Não é só na forma, por exemplo, com que Ferro Rodrigues mandou calar o sr. Ventura. É também, e sobretudo, nas propostas apresentadas pela esquerda. Estas tendem a desviar-se da luta por uma justiça social e a procurar os temas chamados fracturantes. Por exemplo a proposta da deputada do Livre de devolução do património existente em Portugal das ex-colónias portuguesas, quando este nunca foi reivindicado pelas mesmas. Mais que na resposta racista do sr
Ventura, a esquerda tem que pensar na opinião do eleitorado sobre este assunto. Todas as iniciativas da esquerda devem ser tomadas de forma pragmática, não dando espaço para que a nova direita cresça. Fundamentalmente, a esquerda tem que se preocupar com a vida das pessoas que representa. E isso implica um batalhar na questão da justiça social, questão essencial e nunca resolvida, ou pelo menos mitigada, nos últimos 46 anos. Antes, bastante agravada com o governo de Passos Coelho e a intervenção, desejada pela direita, da troika. A esquerda também terá que estar alerta para as novas tecnologias, em vez de fazer delas restrições à liberdade individual, como o governo PS pretende. A questão da liberdade vs uma omnipresença do Estado é outro problema com que a esquerda lida mal. O Estado deve servir de suporte às pessoas quando elas precisam, e de regulador entre o poder, cada vez maior das grandes empresas e os indivíduos. E por isso deve auto-limitar-se. E naturalmente, descer a carga fiscal. Talvez isto interesse mais às pessoas, e sirva de dique contra a nova direita, que as causas fracturantes.
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