Amigos, deixemos ir no ar as borboletas
que voam breves. Deixemos-las voar.
A terra abriu as asas nesta manhã de primavera
em cada uma delas. Deixemos o azul voar.
A beleza das coisas, amigos, é o limite
do canto. Deixemo-nos cantar.
E mesmo se é dezembro e a cidade oscila
num sono incerto e vário, deixemo-la tecer
os fios luminosos da manhã.
*
NEBLINA
A melancolia é um barco encalhado
no meio do Tejo, numa manhã de nevoeiro.
Chora o Cais das Colunas, num filme
a preto e branco, a memória dos que partiram
para o deserto sem regresso do império:
gaivotas acenando em terra, voando
em círculo sobre os mastros, onde flutuam,
imóveis, os estandartes do tempo.
Um rei que não regressa é um rei morto,
mesmo que os seus olhos nos fitem na distância,
no espanto de um tesouro por encontrar.
Há dias em que, na espuma do Tejo, o que regressa
são os navios dos que o seguiram rumo ao sul.
(de Paisagens e outros lugares a discutir, ed. Arte Comum, Lisboa 2005)
Graça Videira Lopes nasceu em Mangualde. Tem uma basta bibliografia na sua área de estudo: a poesia Galego-Portuguesa. Como poeta publicou Horácio e as Bonecas (Fenda, 1983) e Paisagens e outros lugares a discutir (2005). Está representada na antologia poética Sião (Frenesi, 1987).
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