A PALAVRA IMPOSSÍVEL
segunda-feira, maio 30, 2022
Adolfo Casais Monteiro
sábado, abril 30, 2022
Dionísio, o sofista (Antologia Palatina)
quinta-feira, março 31, 2022
A GUERRA É A GUERRA
1. A guerra é estúpida. Os governantes, eleitos pelo povo ou não, que ordenam as guerras são estúpidos, os generais são estúpidos, os mancebos que fazem a guerra, que dão a vida por uma ideia de nação ou pátria, são estúpidos - e não heróis como muitas vezes são proclamados - na sua obediência cega aos ditadores e generais. Tudo isto parece bastante ingénuo, mas creio que é uma verdade simples. É também uma perspectiva anarquista e antimilitarista. Não há uma evolução na humanidade: a obediência aos que ordenam a guerra, o sadismo da destruição do outro, é algo que permanece ou se intensifica há séculos, há milénios, sempre repetido. Parte da História faz-se de guerras, de mesquinhos sentimentos nacionalistas, ainda hoje alimentados entre os povos como há séculos. Não há lição que os povos tenham aprendido para terminarem com a guerra. É certo que depois do uso de armas nucleares na II Guerra Mundial, depois da guerra fria, parecia que não podíamos ter de novo guerras. Mas enquanto durou a guerra fria, EUA e URSS promoveram a guerra em muitos países ...
2. A Rússia invadiu a Ucrânia a 24 de fevereiro passado. A Rússia já tinha invadido a Crimeia, há uns anos, sem grande alarido. A Ucrânia é, como se sabe, uma ex-república da União Soviética - antes estivera sob o domínio da Rússia dos Czares. A partir do início da década de 1990, com o fim do comunismo e da URSS, a Ucrânia tornou-se um estado independente. Era o tempo em que foi declarado "o fim da História", porque o capitalismo ocidental perdia o seu antagonista nas ditaduras comunistas da Europa de Leste. Se não era o fim da História - e evidentemente que não foi - era pelo menos o fim da guerra fria, o fim da cortina de ferro, o fim do muro de Berlim - e também o fim do império soviético, que se desmembrava. A Europa mudou, o mundo mudou, nessa década finissecular. A União Europeia foi-se expandindo para leste, e já um pouco secretamente, a NATO também. No fim do milénio, um alcoolizado Boris Iéltsin dá lugar a um ex-espião do KGB como timoneiro desse ainda imenso país que é a Rússia. Vladimir Vladimirovich Putin é, em 1999, eleito presidente da Rússia. Não largará mais o poder, entre o cargo de presidente e de primeiro-ministro, é ele que manda nesse imenso país de escravos. Ele é o ditador que a novilíngua chama, agora, de autocrata. Tem um tique perverso e sofisticado para eliminar os seus adversários: o uso de venenos radioactivos e químicos. Certo é que, do outro lado, a NATO se foi aproximando do urso gigante, não ligando, assobiando para o lado, ou fazendo-se esquecida de quem tinha pela frente. Putin, que tem seis mil ogivas nucleares, quer deixar a sua marca na História. Para isso volta-se para o expansionismo: pretende voltar a fazer da Rússia o que ela foi no tempo da "sua" União Soviética.
3. Na manhã de 24 de fevereiro o mundo, que é o mundo dos ecrãs (smartphones, televisões, computadores), acordou histérico. A Rússia tinha invadido a Ucrânia, algo que já se esperava depois de Putin ter anexado as duas Repúblicas separatistas russas que lutavam pela independência dentro da Ucrânia. A Ucrânia não era um país simples nem pacifico - na sua história, na sua composição onde cerca de um terço da população é de origem russa. É também um país que tem tido como presidentes alguns fantoches de Putin. Mas Vladimir Vladimirovich não optou, agora, por essa solução. Por isso, as cidades Ucranianas são agora campos de devastação, a Europa enfrenta a maior crise de refugiados desde a II Guerra Mundial. O actual presidente da Ucrânia, Zelensky, era um actor de comédia que fez um programa de tv onde interpretava a figura de um presidente da Ucrânia; o sucesso do programa levou Volodymir Zelensky a passar o que era do domínio da ficção para a realidade e a candidatar-se às eleições presidenciais ucranianas. Onde já se viu isto? O sucesso mediático transposto para o sucesso político (veja-se o movimento 5 Estrelas na Itália, o palhaço Trump nos EUA, ou mesmo Marcelo Rebelo de Sousa que teve mais de 10 anos de presença televisiva como comentador-mor para se tornar em presidente da República). Um sintoma da política actual: faz-se através da tv e das redes sociais.
4. A partir de 24 de fevereiro, e quase até agora, os canais televisivos de informação voltaram ao modo monotemático como tinham feito no início da pandemia, há 2 anos. A guerra na Europa. Rapidamente todo o Ocidente tomou o partido da Ucrânia contra o agressor Putin e a Rússia. Canais de televisão russos, como a RT e agências noticiosas russas foram censuradas pelo ocidente. Putin, entretanto, fez aprovar um decreto onde proibia a utilização da palavra "guerra". A invasão da Rússia à Ucrânia era uma "operação militar especial". Os correspondentes de órgãos de comunicação social em Moscovo, na generalidade, abandonaram a Rússia. Ficaram só as imagens de refugiados, de abrigos, de repórteres medrosos, da devastação da guerra esventrando edifícios. Os refugiados que por esta altura são cerca de 4 milhões, mulheres e crianças, porque o presidente Zelensky proibiu os homens entre os 20 e 60 anos de deixarem a Ucrânia, para combater pela pátria, espalham-se pela Europa. E, principalmente, as sanções económicas decretadas pelo ocidente à Rússia e aos oligarcas russos, a Putin e aos membros do seu governo. As sanções e a guerra que fazem ricochete nas economias ocidentais: a inflação sobe para níveis de há 20 ou 40 anos (o caso da Alemanha, enquanto em Espanha se atingiu 10 por cento de inflação). A gasolina sobe, sobe, ás vezes desce, e volta a subir ao compasso do petróleo ou da pura especulação.
5. A guerra, esta guerra que não é nossa, mas que os governos ocidentais, a NATO e principalmente os mass-media, tornaram nossa, tem um forte aliado: o medo. O medo, aqui no extremo ocidental da Europa, a 4000 km de Kiev, ainda funciona. É uma simples expressão: III Guerra Mundial. É claro que é assustadora, porque uma III Guerra Mundial não pode existir; se se utilizar armas nucleares, como dizia alguém, nem é bom pensar. Por isso a NATO nunca deveria ter-se aproximado da Rússia (aliás, a NATO já não deveria existir, como não existe o Pacto de Varsóvia). O medo instala-se melhor na poltrona quando se fala de armas nucleares, quando Joe Biden espicaça o urso Putin. Como escreveu o poeta Alexandre O' Neill, "o medo vai ter tudo". E, nunca como nestes tempos, pelo menos desde o fim da II Guerra Mundial, o medo esteve tão bem instalado, ouvindo as trombetas mediáticas que faz tocar.
segunda-feira, fevereiro 28, 2022
segunda-feira, janeiro 31, 2022
LEGISLATIVAS 2022: DA MAIORIA ABSOLUTA AOS NOVOS FASCISTAS
1, O Partido Socialista venceu, ontem, inesperadamente, por maioria absoluta as eleições legislativas. Inesperadamente porque as sondagens, que se perfilam como uma verdade absoluta, quase se substituindo às eleições, davam um "empate técnico" entre PS e PSD. A maioria absoluta do PS não é nada de bom, a não ser para o PS e para António Costa. Uma maioria absoluta significa que o próximo governo PS poderá governar sem dialogar com outras forças políticas. Mas quem criou as condições para esta maioria absoluta do PS foram dois partidos responsáveis por estas eleições ao chumbar o OE para 2022: o Bloco de Esquerda e o PCP - e por essa atitude irresponsável foram fortemente penalizados. É algo que não é novo, já em 2011, a chamada esquerda radical, abriu as portas a Passos Coelho e à troika ao chumbar o PEC 4. Portanto, o mau resultado do BE e PCP deve ser visto como uma penalização do eleitorado por criarem eleições antecipadas e porem fim à geringonça (é certo que Marcelo também teve culpa em marcar estas eleições). Com isto ganhou o PS, que terá ainda ido buscar votos ao centro direita, onde um Rui Rio andou errante.
2, A entrada do partido de extrema-direita, com um grupo parlamentar de 12 deputados, tornando-se a terceira força política no parlamento, não é uma surpresa. Foi algo muitas vezes anunciado pelo seu líder, pelas sondagens e pelo resultado que o seu líder populista obteve nas eleições presidenciais do ano passado. Como foi possível isto - um partido populista de tendência fascista tornar-se no terceiro partido português? Como é possível que um partido que defende a prisão perpétua, a castração química para os pedófilos, o fim do Estado providência, do RSI, que tem uma matriz racista e xenófoba tenha agora 12 deputados na Assembleia da República? Creio que a culpa é dos média que criaram o fenómeno A. V. Não existia uma inevitabilidade em Portugal ter um partido "populista" como a Espanha tem o Vox ou a França tem a FN da família Le Pen. É certo que o discurso populista, apelando ao fantasma de Salazar, já há muito que era ouvido em certas camadas da população, e a relação com o fantasma de Salazar e do Estado Novo nunca foi resolvida.
3, Mas houve outras novidades nestas eleições. O desaparecimento do CDS, partido chamado de fundador da democracia portuguesa, que apesar de uma boa campanha de Francisco Rodrigues dos Santos, não conseguiu eleger nenhum deputado. O partido perdeu excelentes deputados, como o PCP que perdeu João Oliveira e António Filipe. A Iniciativa Liberal foi outro partido que tendo apenas um deputado surge agora com um grupo de oito. É um partido que perfilha algumas causas da esquerda, na matéria de valores, mas que está bastante à direita, naturalmente pelo fim do Estado providência. O PAN, que queria ser um parceiro de um governo de esquerda ou direita apenas conseguiu eleger a sua líder, Inês Sousa Real. Já no Livre o historiador Rui Tavares conseguiu, finalmente, eleger-se, depois de na anterior legislatura se ver forçado a abdicar de Joacine Katar Moreira.
4, Todos estes resultados apontam para uma certa decepção. Há falta de partidos interessantes. Por exemplo não existe um verdadeiro partido verde em Portugal (o PEV que estava coligado com o PCP, embora fosse pouco verde, também desaparece da AR) que coloque como tarefa primeira o combate às alterações climáticas. Os partidos de esquerda - e também de direita - esquecem aqueles que por várias razões não trabalham, como se essas pessoas acossadas por um desemprego crónico que as atira muitas vezes para a miséria fossem lixo social - e na verdade assim são tratadas. António Costa pode prosseguir, agora, uma agenda que não existe. O primeiro-ministro está mais interessado no poder pelo poder do que em solucionar de forma eficaz os problemas dos portugueses. Por isso, continuará, certamente, a obedecer aos ditames de Bruxelas, ás exigências da Banca (repare-se que enquanto a comunicação social se interessa por um banqueiro já condenado e na prisão, um outro, António Ramalho do Novo Banco, assalta despudoradamente os cofres do Estado), a uma burocracia tecnológica que se pode aproximar de cenários orwellianos. É esta a democracia que temos, se por democracia entendermos apenas a sua representação institucional, em que ao votar, mal informados, os portugueses passam um cheque em branco aos seus alegados representantes. Mas, para além de uma necessária mudança na lei eleitoral, que a torne mais representativa, a democracia vive-se no dia-a-dia
segunda-feira, janeiro 03, 2022
sexta-feira, dezembro 31, 2021
LIVROS EM 2021
2, Um género talvez menor no panorama editorial português é o ensaio, e em particular o ensaio com a assinatura de autores portugueses. Este ano tivemos a reunião das crónicas escolhidas, por António Guerreiro, que há anos publica semanalmente no Público. Para o autor de Zonas de Baixa Pressão, que escolhe cerca de 200 crónicas, são micro-ensaios, agrupados por temas como a política, o jornalismo, a escola ou a literatura, entre outros. Vale a pena recordar que António Guerreiro escreve há décadas nos jornais, o que faz dele uma figura não só de crítico literário, mas na ausência de um Eduardo Prado Coelho, talvez dos últimos intelectuais a escreverem na imprensa, o seu substituto. Diga-se que a bibliografia de António Guerreiro é escassa, e que muitos textos de crítica literária que foi publicando ao longo dos anos - principalmente no Expresso - mereciam ser reunidos em livro, porque abrem horizontes de leitura da obra de alguns autores, principalmente poetas. Outros ensaios a referir, entre a filosofia e os estudos literários são os dois livros publicados por Maria Filomena Molder, 3 Conferências (sobre o Qohélet / Ecclesiastes)(esta editada pela Saguão é a primeira), e o pequeno livro A Arqutectura é um Gesto - Variações sobre um motivo wittgensteiniano (edição da pequena editora Sr. Teste). Também Silvina Rodrigues Lopes reuniu um conjunto de ensaios publicados pelas edições Saguão, O nascer do mundo nas suas passagens. Um novo pessoano, Humberto Brito, apareceu com A interrupção dos sonhos - ensaios sobre Fernando Pessoa (Relógio d' Água). Por fim, o destaque para duas figuras do pensamento libertário: Guy Debord com os seus Comentários sobre a Sociedade do Espectáculo (Antígona) e Piotr Kropotkine de quem, no seu centenário a Antígona editou O Apoio Mútuo (trad. Miguel Serras Pereira) - um livro a ser lido e pensado, contra o darwinismo social que atravessamos e ao qual o autor se opunha.
3, No que respeita à ficção, saliente-se a ausência de alguns autores consagrados, como A. Lobo Antunes. Queria, no entanto, referir-me a uma autora que já tendo começado a publicar em 1980, mantém uma discrição notável no meio literário português: Teresa Veiga. Este ano publicou na Tinta da China mais uma excelente novela - ou romance -, O Senhor d´Além. De Teresa Veiga, que já ganhou o prémio de conto Camilo Castelo Branco por 3 vezes e o prémio de ficção do Pen Clube português, pouco se sabe para além de uma "nota biográfica" que aparece no final do seu último livro. A autora não dá entrevista, não se lhe conhecem fotografias, e evidentemente não participa em festivais literários. Não será propriamente uma Elena Ferrante, mas a postura ética das duas autoras em relação à mediatização do escritor aproximam-se.
4, Chegamos à poesia, de que se apresenta mais abaixo uma longa lista de livros publicados. De salientar que esta lista tem várias lacunas, não pretendendo ser exaustiva. Talvez o livro mais estranho publicado em Portugal em 2021 tenha sido Vaca Preta de Marcos Foz (edição Snob). Trata-se de um hibrido entre poesia e prosa. O autor publicou, em edição de autor, em 2019, o seu primeiro livro de poesia, logo, estaremos na presença de um poeta? Mas Vaca Preta inicia-se por um poema que ocupa as primeiras 25 páginas do livro; mas o mais estranho neste poema, é a inserção abundante de imagens a cores e também a preto e branco sem que sejam propriamente ilustrações. Na página 27 começa a segunda parte do livro, que tem cerca de 130 páginas, com texto em prosa. Talvez se lhe possa chamar-lhe prosa poética. Para além disso o livro tem um encarte de 16 páginas. Este será um dos objectos literários mais estranhos da literatura portuguesa. Talvez se possa enquadrar numa nova vaga de poesia experimental, de que os últimos livros de Rui Pires Cabral seriam um exemplo. Mas o ano contou também com a "reabilitação" de um poeta que estava esquecido por não publicar: António Franco Alexandre que publicou na Assírio & Alvim Poemas, a reunião da sua obra poética, acrescida de um novo conjunto de poemas. Destaque-se ainda a publicação de um livro de inéditos de Joaquim Manuel Magalhães, Canoagem, que prossegue a segunda vida poética do autor de Um Toldo Vermelho. Obras reunidas a salientar: Fatima Maldonado, com Sem Rasto (Averno), Albano Martins com Por ti eu daria (ed. Glaciar), António Aragão com Obra (Re)Encontrada e Adília Lopes que voltou a reunir a sua obra, uma vez mais sob o título Dobra, um volume que já ultrapassa as mil páginas. A Assírio & Alvim, de cujo catálogo de 2021 já referimos alguns títulos, ainda editou Todos os Poemas de F. Holderlin numa nova tradução de João Barrento (já existia a de Paulo Quintela, mas cada época tem o seu germanista de serviço), a poesia completa de Sá de Miranda, a prosa completa de Sophia, a ainda poesia completa de Garcilaso de la Vega numa tradução de José Bento... ou seja, são demasiados calhamaços, demasiadas obras completas, excesso de peso poético.
terça-feira, novembro 30, 2021
António Guerreiro - Zonas de baixa pressão
António Guerreiro, Zonas de Baixa Pressão - Crónicas Escolhidas, Edições 70, 2021, p. 32
domingo, outubro 31, 2021
QUADRAS POPULARES (de O Surrealismo na Poesia Portuguesa)