Quem chegasse a Portugal na passada sexta-feira, ao olhar para uma banca de jornais e ler a manchete do Expresso, julgaria que as eleições já se tinham realizado na passada terça ou quarta-feira e o novo primeiro-ministro português era o líder do PSD Passos Coelho que estava a formar governo com Paulo Portas e talvez o PS. Olhando um pouco para os outros jornais facilmente tomaria os gráficos das sondagens por resultados eleitorais. Num café ou restaurante, o nosso visitante, espanhol ou italiano ou de outro pais, com médios conhecimentos de português, ao ouvir os comentários de uma SIC-Notícias, RTPN ou TVI 24, reforçaria a ideia de que as eleições se tinham realizado num dia desta semana e que a direita tinha conquistado mais um pais europeu. Tudo isto é absurdo, contrário a qualquer espírito democrático, mas foi o que se passou nos últimos dias de campanha. Os vários meios de comunicação social tomaram a virtualidade de sondagens pouco representativas pela realidade. A manchete do Expresso é sintomática de tudo isto. O desejo estúpido de banir Sócrates do governo foi tomado por realidade antes de o ser. Mas não só: os média, cujos patrões têm interesse num governo de direita (o fundador do PSD é o patrão do grupo que detém o Expresso, a SIC, a Visão e outros média, enquanto o líder da Sonae é proprietário do Público) tentaram – e possivelmente vão conseguir – criar uma realidade que apresentava a vitória do PSD como um facto adquirido. Neste sentido as eleições que se realizam hoje não são senão uma confirmação, um plebiscito, às sondagens que diariamente apareceram nos meios de comunicação. Estas eleições são um case study sobre a forma como o jornalismo, as empresas de comunicação social e as empresas e universidades responsáveis pelas sondagens manipularam a opinião pública como há muito tempo não acontecia, ou talvez nunca tenha acontecido em Portugal.
A manipulação da opinião pública não se faz apenas através dos números, mas do discurso que enforma esses números. Aqui cabem três actores: o jornalista que elabora a peça sobre a sondagem, e que foge a sete pés da obrigatoriedade legal de ter que ler ou publicar a ficha técnica da sondagem, o especialista em sondagens e o comentador. Este último é uma espécie que se tem reproduzido, ocupando cada vez mais tempo de emissão, podendo facilmente ser equiparada a comendador, uma espécie de comendador Acácio (personagem de Os Mais). O comentador / comendador não diz senão algumas evidências, verdades de La Palice, mas goza da autoridade de uma sibila. Não existe grande diferença entre o que diz um comentador e o que diz um taxista. Os comentários do último são muitas vezes mais inteligentes. Mas o comentador existe com o pressuposto de que os espectadores são acéfalos, cabeças vazias a quem tem que ser revelada a verdade. O comentador toma o lugar do profeta ou num tom menos grandiloquente, da bruxa; ele anula, ao esboçar cenários, qualquer possibilidade de um político precisar de recorrer ao professor Bambo. O último actor nesta manipulação é o especialista e responsável pelas sondagens. Este só dá a cara na emissão especial das eleições para corrigir e comentar a última sondagem, aquela que foi feita no próprio dia das eleições para que as televisões às 20h00 possam anunciar o próximo primeiro-ministro. Se a sondagem falha é muito mau. Se hoje, quando começarem a ser conhecidos os resultados reais – os das eleições –, estes não coincidirem com os das sondagens é porque algo falhou. Mas como nada costuma falhar, as eleições apenas servem para confirmar as sondagens. Aliás as eleições são algo dispendioso que podia ser dispensado. Em vez de eleições podia-se distribuir os deputados pelo novo parlamento através do rigor de uma sondagem. Mas os portugueses são obedientes e a estatística uma ciência exacta.
Dito isto, importa ainda dizer algo óbvio: seja qual for o governo saído destas eleições (ou direi melhor sondagens) o seu programa já está definido: é o plano da troika (FMI/BCE/UE). Isso foi quase totalmente ignorado nesta campanha, não só porque convinha aos partidos que querem o poder, mas porque os meios de comunicação social assim o quiseram.
A manipulação da opinião pública não se faz apenas através dos números, mas do discurso que enforma esses números. Aqui cabem três actores: o jornalista que elabora a peça sobre a sondagem, e que foge a sete pés da obrigatoriedade legal de ter que ler ou publicar a ficha técnica da sondagem, o especialista em sondagens e o comentador. Este último é uma espécie que se tem reproduzido, ocupando cada vez mais tempo de emissão, podendo facilmente ser equiparada a comendador, uma espécie de comendador Acácio (personagem de Os Mais). O comentador / comendador não diz senão algumas evidências, verdades de La Palice, mas goza da autoridade de uma sibila. Não existe grande diferença entre o que diz um comentador e o que diz um taxista. Os comentários do último são muitas vezes mais inteligentes. Mas o comentador existe com o pressuposto de que os espectadores são acéfalos, cabeças vazias a quem tem que ser revelada a verdade. O comentador toma o lugar do profeta ou num tom menos grandiloquente, da bruxa; ele anula, ao esboçar cenários, qualquer possibilidade de um político precisar de recorrer ao professor Bambo. O último actor nesta manipulação é o especialista e responsável pelas sondagens. Este só dá a cara na emissão especial das eleições para corrigir e comentar a última sondagem, aquela que foi feita no próprio dia das eleições para que as televisões às 20h00 possam anunciar o próximo primeiro-ministro. Se a sondagem falha é muito mau. Se hoje, quando começarem a ser conhecidos os resultados reais – os das eleições –, estes não coincidirem com os das sondagens é porque algo falhou. Mas como nada costuma falhar, as eleições apenas servem para confirmar as sondagens. Aliás as eleições são algo dispendioso que podia ser dispensado. Em vez de eleições podia-se distribuir os deputados pelo novo parlamento através do rigor de uma sondagem. Mas os portugueses são obedientes e a estatística uma ciência exacta.
Dito isto, importa ainda dizer algo óbvio: seja qual for o governo saído destas eleições (ou direi melhor sondagens) o seu programa já está definido: é o plano da troika (FMI/BCE/UE). Isso foi quase totalmente ignorado nesta campanha, não só porque convinha aos partidos que querem o poder, mas porque os meios de comunicação social assim o quiseram.
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