1, De uma moeda lançada ao ar, ou saí cara ou
coroa. Das eleições presidenciais norte americanas, disputadas no passado dia 5
entre Kamala Harris (partido Democrata) e Donald Trump (partido Republicano),
ganhou Donald Trump, o candidato que foi presidente dos EUA entre 2016 e 2020.
A vitória de Trump voltou a soar quase como um escândalo entre os milhares de
jornalistas de países ocidentais que foram, insones, em gesto de vassalagem,
cobrir o acontecimento na madrugada do dia 5 para 6. Trump é um perigo para o mundo?
Sim, em determinadas matérias como as alterações climáticas é, de facto, um
perigo, porque faz parte da “vanguarda” de extrema-direita negacionista que
parece querer exterminar as democracias representativas liberais.
2, É longa no tempo a vassalagem da Europa em relação aos EUA. É certo que os Estados Unidos ajudaram a Europa a livrar-se do nazismo, durante a II Guerra Mundial. Mas os mesmos EUA lançaram duas bombas nucleares sobre Hiroxima e Nagasáqui. Não bastou lançarem uma bomba sobre Hiroxima, que terá morto cerca de 70 mil pessoas, para os americanos mostrarem ao mundo e ao Japão que detinham a arma mais mortífera que alguma vez existiu na história da Humanidade. Era necessário mais uma? Leo Szilard, um dos cientistas que esteve ligado ao desenvolvimento da bomba atómica afirmou: “Se tivessem sido os alemães a lançar bombas atómicas sobre [as] cidades ao invés de nós, teríamos considerado esse lançamento como um crime de guerra, e sentenciado à morte e enforcado os alemães considerados culpados desse crime no Tribunal de Nuremberg.” As duas bombas nucleares lançadas pelos EUA, que levaram à rendição do Japão e ao fim da II Guerra Mundial, mostram a cultura beligerante Norte-Americana, que permaneceu durante a chamada guerra fria. Intervenções na América Latina, promovendo regimes fascistas ou de extrema-direita, como o de Pinochet; intervenção directa na Asia, com a participação na guerra do Vietname, etc. E, não esquecer, já este século, a invasão do Iraque cujos motivos foram forjados pelo presidente George W. Bush, e que até tiveram a “bênção” do primeiro-ministro português da altura, Durão Barroso.
3, Afinal os EUA são o país dos westerns, dos
cowboys nos seus duelos com revolveres, algo que o cinema de Hollywood retratou
e mitificou, e com que várias gerações de europeus cresceram. Os EUA são o
Império, como outrora na Roma imperial foram os romanos que andaram por várias
regiões da Europa. Daí que quando o PCP chama imperialistas aos Estados Unidos acerte,
ao contrário de outras posições de política externa deste partido centenário. O
imperialismo, a dependência da Europa face aos EUA é total: na cultura –
principalmente na cultura de massas –, na economia, na tecnologia (as grandes
empresas de Silicon Valley), na investigação de ponta nas mais variadas áreas,
na forma como manobram a política externa dos países que são seus aliados
(evidentemente que a China e a Rússia estão do outro lado, numa espécie de nova
guerra fria), no apoio que dão a Israel para levar a cabo um genocídio sobre os
palestinianos da Faixa de Gaza. Sem dúvida que por isto e muito mais os EUA têm
um passado – e presente – negro na História. Mas nada disso impede essa
vassalagem pelo chamado “sonho americano” ou “american way of life”.
4, Mas a 5 de Novembro, os americanos
voltaram a eleger Donald Trump como presidente dos EUA. Trump, o palhaço e a
sua troupe. Alguns nomes desta troupe, desta nova administração, já são
conhecidos. Linda McMahon, uma empresária de wrestling (luta livre), é apontada
para secretária da Educação, o equivalente ao ministro da educação em Portugal.
A escolha de Trump pode – e é – estupida, mas tem o seu sentido. A escola é um
lugar de violência. A escola “antiga”, onde o professor exercia e violência da
palmatória (entre outras), até à escola mais ou menos actual onde os alunos
exercem violência uns sobre os outros, e por vezes, mesmo sobre os professores.
Ora, como anedota nada melhor que uma magnata do wrestling para dirigir a
educação nos EUA.
5, Mas o grande apoio de Trump veio de um dos
homens mais ricos e influentes do mundo: Elon Musk. Musk é dono da Tesla (que
fabrica automóveis), da Space X (uma espécie de NASA, cuja ambição maior será
ir a Marte), comprou o Twitter e rebaptizou-o de X, a rede social onde estão
(quase) todos os políticos do mundo e jornalistas, para além de muita gente
anónima. É ainda dono da tenebrosa Starlink, uma empresa que pretende criar um
implante cerebral para conectar pessoas e computadores, e entre outras
empresas, esteve na fundação da OpenAI, a criadora do Chat GPT. Tudo isto faz
dele o segundo homem mais rico do mundo com cerca de 200 billiões de dólares
(para fazer uma ideia deste número astronómico, o PIB de Portugal era em 2023
de 287 biliões de doláres e o de Marrocos de 141 biliões). Ora dinheiro é
poder, e poder é muitas vezes dinheiro. Trump vai nomear Elon Musk para o cargo
de chefia de um grupo de “eficiência governamental”. Trump e Musk, juntos, são
a maior ameaça ao mundo. No mandato anterior Trump era um palhaço rico
solitário, mas agora é Elon Musk que muito mais que Trump constituiu uma
ameaça: pela primeira vez o homem mais rico de Silicon Valley entra na casa
branca, e com ele as suas ideias algo tenebrosas. A aliança entre o poder
político e o poder económico, ou mais concretamente o poder do olimpo de
Silicon Valley, que representa por si só um novo e outro poder, que anda
connosco nos nossos bolsos, plasmado neste caso na figura de Elon Musk, o
proprietário do X, representa um exponenciar do poder que pode abafar o poder
político tal como o conhecemos: baseado numa constituição, em separação de
poderes, eleições livres, etc. Ou seja, a imperfeita mas na falta de melhor,
democracia representativa. E, nos EUA, a velha democracia nunca esteve tão em
perigo.
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