Um tribunal
italiano condenou seis sismólogos a seis anos de prisão, por estes terem subestimado
a ocorrência do sismo que em 2009 matou cerca de três centenas de pessoas em
Áquila. A decisão deste tribunal, inédita, foi criticada por todo o mundo
científico. E, no entanto, ela mostra a relação que a sociedade actual mantém
com a ciência. Depois da “morte de Deus” anunciada por Nietzsche, Comte ergueu
o seu positivismo em que a ciência se tornava na nova religião. Esta nova
religião está bem viva nos nossos dias: a ciência é a esperança e a verdade –
da medicina á meteorologia. E apesar da constatação diária das falhas destas
duas ciências, a ciência avança, apoiada pelos meios de comunicação social. Cada
disciplina científica vai alargando o seu campo, procurando mais que
explicações (sempre provisórias) para a realidade que em última instância não
podemos conhecer. O que pretendem as ciências é afirmar o seu poder. Talvez
seja hora de juntarmos ao poder económico-político-mediático o poder tecnocientífico.
A história do século passado demonstra como a ciência esteve no melhor e no
pior, da penicilina à bomba nuclear. Podemos dizer que sem ciência viveríamos num
mundo muito pior, um mundo onde a civilização moderna estaria em causa. Mas é
também a ciência que nos ameaça, criando mecanismos que nos escravizam e
controlam perante o poder. A condenação dos seis sismógrafos italianos resulta
sobretudo do estatuto de verdade, como uma verdade teológica, infalível, a que
a ciência ascendeu. E nesse sentido, pode-se dizer que se fez justiça (e
jurisprudência), e que a justiça, no sentido grego antigo de que falava Sophia
de Mello Breyner Andersen num dos seus poemas, se impôs a um dos poderes que
governa o mundo. Lamentável é que os cientistas não percebam que esta
condenação devia ser objecto de reflexão sobre a sua actividade.
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