HAPPY HOUR
Sustenho os primeiros minutos violáceos da aurora
como se o mundo fosse meu de minha autoria
seus êxtases que incham purpurinas minhas veias
para nenhum truque de alfaiate esconder
trago nos lábios uma brincadeira como quem
abre de sopro nossos peitos a nu
somos belos
como a manteiga e o leite podem ser
corto para a divisão da alegria para os pássaros
acordados para o gasto fresco da fruta
saúdo a multidão em falta / sigo com solução o dia
abrevio,
algures o mundo moderno espera por mim
saio com a minha boca a minha pele-vermelha
as minhas botas temperadas de furor heróico
chuto a minha saliva para o sangue dos deuses.
In Divisão da Alegria, Tinta da China, Lisboa, 2022, p. 13
Raquel Nobre Guerra nasceu em 1979. Estudou filosofia (licenciatura e mestrado) e o fragmento na obra de Fernando Pessoa (doutoramento). Publicou Groto Sato (Mariposa Azual, 2012, Prémio primeira obra do PEN Club Português em 2013), Saudação a Álvaro de Campos (2013), Quarto 28: SMS de amor e ódio (Residências no Largo, 2013), Senhor Roubado (Douda Correria, 2016) e Divisão da Alegria (Tinta da China, 2022, "obra escrita ao abrigo de uma bolsa de criação literária do Ministério da Cultura/DGLAB". A sua obra está publicada no Brasil, Alemanha e Colômbia.
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