1, Em meados da década de 1990, num livro intitulado
Ser Digital, Nicolas Negroponte anunciava um mundo imaterial, composto por
bytes. A verdade, mais de duas décadas depois, é que ainda, e felizmente, não
atingimos esse mundo. Apesar das impressoras 3D, o digital ainda só serve para
a transmissão de dados. É neste quadro que o livro como objecto material feito
de papel, “cartolina”, cola, tinta, foi, juntamente com os jornais e revistas,
ameaçado na sua materialidade pelos E-Books. Embora essa ameaça continue a
pairar, o certo é que os livros electrónicos têm sido um flop. O mesmo não se
pode dizer das livrarias, principalmente das que não estão ligadas aos grandes
grupos que dominam o mercado editorial. Da Amazon à Wook, passando pela Fnac, a
compra de livros on-line generalizou-se – mesmo a compra entre particulares
através de sites como o Olx. O problema não está só na facilidade que a compra
on-line oferece, mas também na incapacidade dos livreiros.
2, É neste último sentido que o ano de 2018
foi marcado pelo fecho de algumas livrarias de rua, em Lisboa e no Porto. Uma
delas terá sido nos seus tempos áureos, década de 1980, 1990, uma, ou a,
livraria mais importante em solo português. Era a Livraria Leitura, do Porto,
enquanto teve à sua frente o livreiro Fernando Fernandes, também desaparecido este
ano. No final da década de oitenta, quando pela primeira vez entrei na Leitura,
que ficava então ao cimo da Rua de Ceuta, onde hoje está um moderno salão de
cabeleireiro (ironicamente como se aquele espaço no trespasse trocasse o
interior do cérebro pelo seu exterior capilar), encontrei o espaço mais repleto
de livros que jamais tinha visto. Livros até ao tecto, onde só se chegava com
um escadote, livros em estantes nas escadas que subiam para o primeiro andar,
milhares de livros de todo o mundo num espaço exíguo. Nessa altura a Leitura
era a mais bela livraria do mundo, se tomarmos em conta que o que faz a beleza
de uma livraria são os livros, a potencialidade que eles oferecem, e não o
espaço arquitectónico onde se situam, como acontece com a Livraria Lello – esta
última colonizada actualmente pelos turistas deixou de ser uma livraria para se
tornar num monumento. A Leitura fornecia livros para bibliotecas, fazia um
catálogo, e todos os dias ia uma empregada aos correios que ficavam do outro
lado da rua, com imensos livros para enviar para leitores – imagino que não só
nacionais. Pela Leitura passavam frequentemente as cabeças mais iluminadas do
Porto, e também quem de Lisboa vinha ao Porto. Creio que o sucesso da Leitura
estava numa atenção única que Fernando Fernandes dedicava aos leitores. Numa época
em que não existia internet, em que o conhecimento do que se publicava vinha de
jornais como o El País ou o Magazine Literaire – mas também de outras revistas
mais especializadas – Fernando Fernandes trazia até ao leitor o livro, quer
este se encontrasse nos antípodas, quer estivesse ao lado na Livros do Brasil.
Mas, a maior parte das vezes estava ali, na imensa secção de filosofia ou
poesia, ou no original quer fosse um romance de Thomas Berhnard ou os diários
de Sylvia Plath. Depois Fernando Fernandes reformou-se, vendeu a sua parte,
durante alguns anos a Leitura, que passaria a chamar-se Leitura-Bulhosa, foi
como um pulsar: ampliou o espaço, passando a ter entrada pela rua José Falcão,
abriu livrarias no centro comercial do Bom Sucesso (Boavista) e em Serralves.
Mas sem Fernando Fernandes já não era a mesma Leitura; e com a internet e a
crise financeira viu-se restringida ao espaço da rua José Falcão. A colonização
turística que faz do Porto (e Lisboa) uma cidade completamente descaracterizada,
como se fosse uma Cinne Cità para turista, ajudou a dar a ultima machadada
naquela que foi a maior livraria portuguesa.
3, Apresenta-se a seguir uma lista, por
editoras (23), dos livros de poesia publicados em 2018. Será uma lista
naturalmente incompleta e com erros. No entanto, foi a lista que com algumas
horas de trabalho e a ajuda de sites de editoras, páginas do facebook,
livrarias on-line, e jornais, consegui obter. Desta lista, comparada com a de
outros anos, conclui-se, do ponto de vista editorial, não existirem grandes mudanças.
A poesia continua a ser editada, a maior parte por micro-editoras (algumas só
publicaram um livro), outra por editoras como a Assírio & Alvim, para quem
a edição sendo um negócio, como o das salsichas não deixa de apresentar boa
carne. Ou seja, livros importantes. Está neste caso o primeiro volume da obra
completa de António Ramos Rosa, poeta de extensa obra que corria o risco de
cair no esquecimento. Destaque-se ainda, na mesma editora a tradução de uma selecção
de poemas de William Wordsworth por Daniel Jonas. Se houve autor que enervou,
já desde 2010 os seus leitores, foi Joaquim Manuel Magalhães que este ano,
depois de longo silêncio, voltou com novo livro de reescrita de poemas já
reescritos e alguns inéditos – enfim uma confusão que pode ter a sua lógica.
4, Quanto ao ensaio, ficção e outros géneros
de difícil catalogação, apresento uma pequena lista com a escolha de alguns
livros. Noto por parte da imprensa que ainda se dedica a estes balanços, o
esquecimento de um autor, que quer se goste ou não é fundamental na literatura
e mesmo no pensamento que faz em Portugal: Gonçalo M. Tavares. Dele disse, com
alguma razão José Saramago, que seria o próximo nobel português. O prémio já
caiu em descrédito, mas as razões pelas quais a crítica teima em esquecer
Tavares, ou outras pessoas o colocam nos mesmos termos de um José Luís Peixoto,
são umas obscuras e as outras decorrentes de pura ignorância.
POESIA
ABYSMO
Luis Garcia
Montero - As Lições da Intimidade (Trad. de Nuno Júdice)
Felipe
Benítez Reyes - Privilégio de Penumbra (Pessoana) (Trad. de Vasco Gato)
Antero de
Quental – Poesia III
AA VV - Lisbon Poetry Orchestra (Livro + 2 cd)
ALAMBIQUE
Ricardo
Tiago Moura – Cruzes
AFRONTAMENTO
Fernando
Echevarría - Via Analítica
ARTEFACTO
Miguel
Filipe Mochila - Com a Língua nos Dentes
ASSÍRIO
& ALVIM
António
Ramos Rosa – Obra Poética (Vol. I)
António
Botto – Poesia
Luís
Quintais – Agon
Ron Padgtt –
Poemas Escolhidos (int., sel. e trad. de Rosalina Marshall)
Luís Filipe
Castro Mendes – Poemas Reunidos
Ana Luísa
Amaral / Marinela de Freitas (Org.) - Do corpo: outras habitações
José Alberto
Oliveira (versões) – Poemas da Antologia Grega
José Alberto
Oliveira - De Passagem
Marta Chaves
– Varanda de Inverno
Adília Lopes
– Estar em Casa
Valter Hugo
Mãe – Publicação da Mortalidade
Rosa Alice Branco
- Traçar um Nome no Coração do Branco
Eugénio de
Andrade – À Sombra da Memória (Reed. Pref. de Gonçalo M. Tavares)
Eugénio de
Andrade - Ofício de Paciência (Reed. Pref. de Gastão Cruz)
Eugénio de
Andrade – Rente ao Dizer (Reed. Pref. Federico Bertolazzi)
William
Wordsworth – Poemas Escolhidos (Sel. e Trad. de Daniel Jonas)
AVERNO
Fábio Neves
Marcelino - Canto Irregular
Tiago Araújo
- Ano Zero
José
Francisco Azevedo - Mistérios
Amalia Bautista
- Coração Desabitado (sel. e trad. de Inês Dias)
António
Barahona - Aos Pés do Mestre
Jorge Molder
e Ricardo Álvaro - Morrer
José Carlos
Soares - Camel Blue
Rui Pires
Cabral - Manual do Condutor de Máquinas Sombrias
Carlos
Nogueira/Inês Dias - Grafito
Manuel de
Freitas - Shots
COMPANHIA
DAS ILHAS
Ramiro S.
Osório - Ao largo de Delos
Gisela
Canãmero - Um Mosquito num Voo Baixo. Um Poeta na Revolução
Jorge Aguiar
Oliveira - Pena de Morte
Fernando
Machado Silva - Um Espelho para Reproduzir as Mutações da Vida
Manuel Tomás - Falquejando os Dias
Jaime Rocha
(coordenação
literária) - Poesia, Um Dia. Poetas em Ródão (2012-2017)
Cláudia
Lucas Chéu - Beber pela Garrafa
José Viale
Moutinho - A Pessoa Indicada
Rui Sousa - Ao
Ouvido do Diabo
Paulo da
Costa Domingos - A Vau
José Martins
Garcia - Poesia Reunida
COTOVIA
Manuel
Resende – Poesia Reunida
A M Pires
Cabral - Trade Mark
Amália
Rodrigues – Versos
DO LADO
ESQUERDO
António
Amaral Tavares - Retratos de Nova Iorque
André
Tecedeiro - O Número de Strahler
Miguel-Manso
– Mortel
Miguel
Martins - Film Noir
Eunice de
Souza – Coração de Abacate (Trad. de Francisco José Craveiro de Carvalho)
AA VV –
Mixtape II
DOUDA
CORRERIA
Hugo
Milhanas Machado - Um longo tempo nos pulos do mar
Adelaide
Ivánova - O Martelo
Yiannis
Stiggas - Exupéry Significa Perder-se
João Paulo
Esteves da Silva – Dois Bois e uma Arma na Mão
António
Cabrita - Oitenta flechas para atrair a cotovia/ Livro 1
Raquel Salas
Rivera – Desdomínios (trad. do espanhol e pref. de Mariano Alejandro Ribeiro)
Théodore
Fraenckel – Iluminuras
Maria
Daniela – Cona Cósmica
Ramiro S.
Osório e Sebastião Belfort Cerqueira - RSO&SBC
Manel Seatra
– Dias de Folga
Sandra
Andrade - Caim / Lilith (2ª ed.)
Leonor Sá –
A Poesia Está Fechada
Cristina
Bartleby – O primeiro poeta que despi
Rui de
Almeida Paiva - Canções de Embalar Belos Planetas Cansados
Nuno Marques
– Dia do Não
Cláudia R.
Sampaio – Outro nome para a solidão
Miguel
Loureiro - Confissões de um Exilado no Barreiro
EDIÇÕES 50
KG
Manuel de
Freitas – Sob o Olhar de Neptuno
EDIÇÕES
AVANTE
Manuel
Gusmão – A Foz em Delta
EDIÇÕES DO
SAGUÃO
Alberto
Pimenta – Pensar Depois no Caminho
EDITORIAL
MINERVA
Fernando
Guilherme Azevedo - Barroco Permeável
Paulo Sena -
Passam as Ruas por Mim
Cláudio
Cordeiro - Luz na Face
Maria do
Carmo Cachulo - Pó de Arroz
José Pascoal
- Excertos Incertos
José Pascoal
– Antídotos
José Pascoal
- Sob este Título
José Pascoal
– Ponto Infinito
FRENESI
Paulo da
Costa Domingos – Jocasta
GLACIAR
Carlos Frias
de Carvalho - De Silêncio é o Pólen
IMPRENSA
NACIONAL – CASA DA MOEDA
Vitorino
Nemésio – Poesia (1916-1940)
Pedro Tamen –
Retábulo de Matérias (1953-2013)
Mário Avelar
– Coreografando Melodias no Rumor das Imagens
Alice Sant'
Anna – Aula de Natação
Antonio
Carlos Secchin - Desdizer
LICORNE
Wang Wei –
Habitar o Vazio
Maria
Graciete Besse – Na Inclinação da Luz
Casimiro de
Brito – Memória do Paraíso
António
Ladeira – Somos Infelizes
LÍNGUA MORTA
Luis Alberto
de Cuenca – A Vida em Chamas (uma antologia) (sel. trad. prólogo e notas de Miguel
Filipe Mochila)
Henri
Michaux – Moriturus e outros textos (Org. e Trad. Rui Caeiro)
Luís Pedroso
– Importunar o Tempo à Fisga
Eduardo
Guerra Carneiro – Mil e Outras Noites (sel. Miguel Filipe Mochila)
Vasco Gato –
Um Passo Sobre a Terra
Roberto
Juarroz – A Árvore Derrubada Pelos Frutos (sel. e trad. de Rui Caeiro, Duarte
Pereira e Diogo Vaz Pinto)
Ángel
González – Para Que Eu Me Chame Ángel González (sel., trad., prólogo e notas de
Miguel Filipe Mochila)
(NÃO)
EDIÇÕES
Laura Erber
- Mesa de Inspecção do Açúcar e Tabaco
Isabel
Nogueira – Marginal
Rui Dias
Monteiro – Reunião de Pedras
Álvaro Seiça
– Previsão para 365 Poemas
OPERA OMNIA
Carlos Poças
Falcão – Sombra Silêncio
PUBLICAÇÕES DOM
QUIXOTE
Maria Teresa
Horta – Estranhezas
Nuno Júdice
- A Pura Inscrição do Amor
Manuel
Alegre - Todos os Poemas São de Amor
RELÓGIO D’
ÁGUA
Bernardo Pinto
de Almeida – A Ciência das Sombras
Joaquim
Manuel Magalhães – Para Comigo
João Miguel
Fernandes Jorge – Fuck the Polis
Marianne
Moore - O Pangolim e Outros Poemas (Trad. Margarida Vale de Gato)
Arthur
Rimbaud – Obra Completa (Trad. João Moita e Miguel Serras Pereira)
Gonçalo M.
Tavares – Livro da Dança (reed.)
TINTA DA
CHINA
Alberto
Lacerda – Poemas Escolhidos (Sel. e Pref. de Luís Amorim de Sousa)
Pedro Mexia –
Poemas Escolhidos
Fernando
Pessoa – Fausto
Fernando
Pessoa – Poesia. Antologia Mínima
Fernando
Luís Sampaio - Aprender a Cantar na Era do Karaoke
Tatiana Faia
– Um Quarto em Atenas
·
ENSAIO,
FICÇÃO, POESIA & OUTROS – UMA SELECÇÃO
António
Guerreiro – O Demónio das Imagens (Língua Morta)
José Gil –
Caos e Ritmo (Relógio d’ Água)
Roberto
Esposito – De Fora. Uma Filosofia para a Europa (Edições 70)
Yuval Noah
Harari - 21 Lições para o Século XXI (Elsinore)
Karl Kraus –
Aforismos (VS – Vasco Santos Editor)
Clarice
Lispector – Correio para Mulheres (Relógio d’ Água)
Rui Nunes - Suíte
e Fúria (Relógio d’ Água)
Dulce Maria
Cardoso – Eliete (Tinta da China)
José
Sesinando – Obra Perfeitamente Incompleta (Tinta da China)
José Riço
Direitinho – O Escuro que Te ilumina (Quetzal)
Gonçalo M.
Tavares - O Senhor Brecht e o Sucesso (posf. Alberto Manguel) (Relógio d’ Água)
Gonçalo M.
Tavares - O Senhor Walser e a Floresta (posf. Alberto Manguel) (Relógio d’
Água)
Gonçalo M. Tavares - Cinco Meninos, Cinco
Ratos (Bertrand)
Gonçalo M.
Tavares - Breves Notas sobre Literatura-Bloom (Relógio d’ Água)
Carlos Poças
Falcão – Sombra Silêncio (Opera Omnia)
Herberto Helder - Em Minúsculas (Porto Editora)
Herberto Helder - Em Minúsculas (Porto Editora)
Manuel
Resende – Poesia Reunida (Cotovia)
António
Ramos Rosa – Obra Poética (Vol. I) (Assírio & Alvim)
Roberto
Juarroz – A Árvore Derrubada Pelos Frutos (Língua Morta)
William
Wordsworth – Poemas Escolhidos (Sel. e Trad. de Daniel Jonas)